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Samanta Luchini    |   10/10/2017   |   Desenvolvimento Humano   |  

Alguns Equívocos da Liderança - Parte 1

Refeltir sobre algumas crenças limitadoras acerca da liderança é fundamental para alcançar melhores resultados em termos de aprendizagem e desenvolvimento. Ressignificar algumas percepções é o primeiro passo para se tornar um líder melhor.

O fato de que a liderança é uma atribuição que requer conhecimentos específicos, habilidades bem desenvolvidas e as atitudes corretas não é novidade. E a maioria dos que se lançam a esse desafio, geralmente tomam consciência pela própria experiência e necessidade, quando já assumiram a responsabilidade por um grupo de pessoas e com elas precisam atingir seus objetivos.

Nesse contexto, configuram-se os famosos e necessários PDL’s – Programas de Desenvolvimento de Liderança – nos quais os “novos” líderes recebem um aporte de conteúdos que envolve desde as questões mais gerais, como por exemplo os papéis e as responsabilidades do líder, formação e desenvolvimento de equipes e a dinâmica da motivação humana, até questões mais específicas como delegação, gestão do desempenho e feedback.

Não há dúvida de que a aquisição desse tipo conhecimento, acompanhada pelo interesse e pela prática no dia-a-dia, pode formar um bom líder. Contudo, esse desenvolvimento só alcança sua melhor contribuição se o líder refletir sobre e ressignificar algumas crenças (modo de ver e pensar sobre algo) que por muitos anos acompanham o conceito de liderança. Não falo aqui de todas as crenças sobre liderança, porque algumas são bastante positivas e podem impulsionar a aprendizagem. Refiro-me àquelas que, de alguma forma, limitam o desenvolvimento e impedem que os conhecimentos adquiridos se manifestem no comportamento, produzindo assim os efeitos desejados.

Estas crenças são maneiras equivocadas de perceber e manifestar a liderança, por isso gostaria de falar um pouco sobre algumas delas e estimular a sua reflexão.

Os bons líderes já nascem líderes. É claro que todo líder nasce! Assim como os médicos nascem, os advogados nascem e os engenheiros nascem. Esse equívoco é fruto da primeira sistematização dos estudos de liderança, que foi muito popular até os anos de 1940, batizada como Teoria dos Traços ou Teoria do Grande Homem.

"Parabéns você ganhou um líder"

Essa teoria explicava a liderança como a habilidade daqueles que haviam nascido com algum traço diferenciado, seja na dimensão física, intelectual ou da personalidade, que os permitia exercer influência sobre outros. Aquelas pessoas que não possuíam nenhum traço diferenciado, jamais poderiam almejar algo parecido.


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Podemos dizer que algumas características de personalidade que nos acompanham desde o nascimento podem sim ser facilitadoras no processo de desenvolvimento da liderança, tais como flexibilidade, tolerância e tenacidade, mas elas não são determinantes. Assim como o fato de não possuir nenhuma característica tão marcante ou favorável, não se converte numa sentença proibitiva.

É mais produtivo olhar pela lente da educação. Inclusive, uma das origens que se atribui a essa palavra é exduco (ex - para fora e duco – guiar, liderar). Desta forma, educar significa guiar alguém para fora de si mesmo, extrair a liderança que já existe dentro das pessoas. Por isso os liderem podem e devem ser construídos, a partir da identificação e da prática dos comportamentos considerados assertivos para essa atribuição.

Qualquer pessoa pode ser líder. Esse equívoco é um desdobramento do anterior. Por mais que a educação seja o caminho para a formação de um líder, ela pode ser invalidada por um único obstáculo: a escolha, o desejo. Antes de aprender qualquer conceito ou receber um cargo, é preciso tomar essa resolução internamente, é preciso querer. Liderar é uma tarefa complexa e trabalhosa, que demanda uma predisposição interior e muita dedicação. Os líderes precisam ser capazes de abrir mão de suas necessidades e interesses mais legítimos para priorizar as necessidades e interesses de outras pessoas. Precisam colocar seus objetivos pessoais em segundo lugar, para colocar no topo da lista o objetivo do grupo. Precisam enxergar o outro na sua plenitude e apostar todas as fichas no seu potencial. Nem todas as pessoas querem ou conseguem fazer isso.   

Você só lidera quando é designado oficialmente para isso ou quando recebe um cargo. Você já deve ter notado que algumas pessoas, mesmo sem ter nenhuma posição oficial na empresa, são capazes de influenciar os demais. Liderança não tem a ver com cargo, tem a ver com predisposição e competência. Não espere a formalização da situação para incluir no seu repertório diário aqueles comportamentos tidos como positivos na conduta de um líder. John Mawell, uma das maiores autoridades no assunto, defende que você pode liderar de qualquer ponto da organização, mesmo que não ocupe nenhuma das “caixinhas” superiores do organograma. Lidere seus projetos, lidere suas reuniões, lidere seus relacionamentos, lidere suas emoções, lidere seu desenvolvimento. Afinal, aquele que não lidera a si mesmo, não lidera ninguém.

Todo gestor é um líder. O fato de receber um cargo, uma posição oficial, infelizmente não é o suficiente. As habilidades de controle e gerenciamento, que são fortemente exigidas e desenvolvidas nos gestores não são capazes de compensar a falta de habilidade na liderança. Mesmo que o gestor apresente um excelente desempenho nos processos e indicadores pelos quais é responsável, não será capaz de sustentar sua posição se não desenvolver também a capacidade de estimular a motivação das pessoas, construir e manter relacionamentos produtivos, criar uma cultura de engajamento na sua equipe, estabelecer vínculos de confiança com as pessoas e desenvolvê-las. As empresas, em geral, escolhem seus líderes utilizando como critério principal o seu bom desempenho técnico, até como uma espécie de reconhecimento e premiação, sem enfatizar tanto as suas competências comportamentais. Em tese, isso é um erro conceitual grave, pois quando se exerce um papel de líder as exigências recaem muito mais sob a esfera do comportamento, algo que não foi avaliado com a profundidade que merecia. A dica de ouro é, ao conquistar uma posição de liderança que foi obtida pelo seu brilhantismo técnico, trace imediatamente um plano de ação para o desenvolvimento das suas habilidades de liderança. Verifique se sua empresa já possui treinamentos dessa natureza e, se for caso, aja de forma autônoma e protagonize esse caminho. O mercado está repleto de boas soluções e lembre-se: investir em si mesmo é sempre uma escolha acertada.

O líder deve escolher uma boa técnica de liderança e se apoiar nela para obter bons resultados. Conhecer teorias e estar atento às tendências e novidades na área da liderança é muito importante, afinal o ser humano só para de aprender quando decide fazer isso ou quando morre. No entanto, é necessário ter cuidado com as famigeradas “fórmulas de sucesso na liderança”, pois elas nem sempre entregam o que prometem entregar. Uma receita dessas pode não funcionar com todas as pessoas ou em toda as situações. O comportamento humano não é exato ou totalmente previsível; o mundo muda numa velocidade que parece ser maior do que qualquer atualização teórica; a tecnologia está assumindo funções que antes eram exclusivamente humanas. Nesse cenário, um procedimento padrão pode se mostrar insuficiente. Utilize essas técnicas e teorias como orientadores principais da sua atuação, mas assegure-se de criar uma zona de adaptação e flexibilidade, que leve em conta a sua realidade em particular.

O mesmo se aplica aos testes de personalidade, de estilo de liderança e ferramentas de assessment (avaliação), que são muito utilizados nos processos de desenvolvimento. Os resultados e “laudos” oferecidos por esses instrumentos podem facilmente ser transformados em rótulos, verdades absolutas ou até mesmo em justificativas para comportamentos improdutivos. As informações reveladas por essas ferramentas não são eternas ou imutáveis, prova disso é que fazendo uma nova aplicação depois de um certo tempo, os resultados podem ser diferentes. Portanto, utilize essas referências como indicadores e não se deixe condenar ou engessar por elas.

O líder deve ter todas as respostas. Costumo defender a ideia de que o líder sempre tem um pouco mais do que sua equipe. Esse “mais” pode representar a experiência, a maturidade, os conhecimentos técnicos, a formação, o comportamento etc. Do contrário, ele não seria o líder, seria um par. Porém, essa condição não garante que ele tenha todas as respostas de que a equipe necessita ou que tenha sempre as respostas certas. A realidade muda o tempo todo, o mercado muda o tempo todo, a exigência dos clientes muda o tempo todo, as pessoas mudam o tempo todo. Quem de nós nunca experimentou a angústia de perceber que os conhecimentos adquiridos com tanto esforço (na escola ou na vida) já não servem mais para os nossos dilemas atuais? Não crie a expectativa irreal de que pode prover todas as respostas. Esforce-se para ser reconhecido como o primeiro e principal ponto de apoio para sua equipe. Mesmo que tenham que trabalhar juntos na busca pelas respostas ou que a própria equipe possa trazê-las para você. Esse é o trabalho dos grandes líderes.

Nossa reflexão não termina por aqui. No próximo artigo, vou abordar mais algumas dessas crenças equivocadas para auxiliar você a obter o maior benefício da sua trilha de aprendizagem e desenvolvimento como líder.

Um grande abraço e até lá...

O conteúdo e a opinião expressa neste artigo não representam a opinião do Grupo CIMM e são de responsabilidade do autor.
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Samanta Luchini

Mestre em Administração com Foco em Gestão e Inovação Organizacional, Especialista em Gestão de Pessoas pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul – USCS e em Neurociência pela Unifesp.
Psicóloga pela Universidade Metodista de São Paulo.
Executive & Life Coach em nível Sênior, com formação internacional pelo ICI (Integrated Coaching Institute) em curso credenciado pela ICF (International Coach Federation).
Professora convidada dos programas de pós-graduação da FGV/Strong, Universidade Metodista e Senac, dos programas de MBA da Universidade São Marcos e Unimonte, e dos cursos FGV/Cademp, para a área de Gestão de Pessoas.
Professora conteudista do Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos – UNIFEOB.
Formadora de consultores e treinadores comportamentais.
Atua há mais de 23 anos com Gestão de Pessoas em diversas empresas e segmentos, dentre elas Wickbold, Bridgestone, Bombril, Solar Coca-Cola, Porto Seguro, Grupo M. Dias Branco, Prensas Schuler, Arteb, Grupo Mardel, Tegma, Pertech, Sherwin-Williams, Grupo Sigla, Unilever, Engecorps, Nitro Química, Grupo Byogene, Netfarma, NTN do Brasil, TW Espumas, Ambev, Takeda, Pöyry Tecnologia,
Neogrid, Scania, Kemp, Ceva Saúde Animal, Embalagens Flexíveis Diadema, Sem Parar, CMOC, Camil e Toyota.
Em sua trajetória profissional e acadêmica, já desenvolveu mais de 27.000 pessoas, com uma média de avaliação superior a nota 9,0 em todos seus treinamentos.
Palestrante, consultora de empresas e autora de diversos artigos acadêmicos publicados em congressos e revistas.
Colunista da revista Manufatura em Foco – www.manufaturaemfoco.com.br


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