A etiqueta do trabalho on-line
Saber administrar os desafios inerentes ao trabalho remoto ele pode ser uma grande vantagem para seus resultados e sua imagem. Seu comportamento é um grande diferencial em qualquer ambiente.
Neste “novo agora” imposto pela pandemia do corona vírus, muitos de nós nos transformamos da noite para o dia em profissionais remotos, digitais e conectados. Tivemos que adaptar boa parte da nossa experiência de vida ao formato on-line, indo muito além daquilo que nos era conhecido. Consultas médicas, sessões de terapia, reuniões de condomínio, visitas a museus... Até os happy-hours e festas de aniversário estão sendo feitas pela tela do computador.
As fronteiras entre nossa vida pessoal e profissional estão parecendo menores e mais fracas neste novo cenário.
Estamos, ao mesmo tempo, respondendo um e-mail e passando o café. Dando aquela revisada numa apresentação e verificando se o arroz já está no ponto. Atendendo uma solicitação do cliente e tirando aquela dúvida de matemática da criança que está tendo aulas on-line. Passando a roupa e assistindo uma aula da pós-graduação. Participando de uma vídeochamada e atendendo ao interfone para receber uma encomenda. Dentre tantas outras atividades profissionais e pessoais, que agora integram e se sobrepõem sem que possamos estabelecer aqueles limites que para nós seriam ideais.
Assim como gosto de usar o termo “novo agora” (porque eu me recuso a acreditar que estejamos vivendo um “novo normal”), também tenho espalhado e defendido a ideia de que não estamos em home-office, tal como essa prática prevê e foi concebida. Nós estamos temporariamente morando no nosso trabalho ou, se você preferir, recebendo o trabalho e todas as suas dimensões, como um hóspede bastante espaçoso e exigente em nossa casa. Uma amiga recentemente me confidenciou que tem medo de abrir a geladeira de madrugada e receber um link de reunião. Nós rimos e nos divertimos muito visualizando a cena, mas você sabe tão bem quanto eu que em toda brincadeira existe um pouquinho de realidade.
O trabalho neste novo formato remoto, tem nos exigido muito mais em termos de foco e concentração, administração do tempo, organização pessoal e da rotina, autogestão, capacidade de execução, disciplina, flexibilidade e consciência. Saber administrar os desafios inerentes a ele pode ser uma grande vantagem para os seus resultados, para a sua imagem profissional e para a sua satisfação pessoal.
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Nesta reflexão quero falar um pouco sobre as famosas videoconferências, que tem possibilitado nossa interação com as outras pessoas, onde acontecem as nossas reuniões de trabalho, às vezes palestras, workshops e treinamentos. Alguns detalhes e comportamentos que às vezes passam despercebidos ou parecem sem importância precisam ser gerenciados, pois podem criar desgaste, constrangimento e comprometer nossa reputação.
Isso sem contar os episódios engraçados e por vezes até bizarros que temos presenciado: pessoas participando de reuniões de dentro do banheiro, trocando de roupa na frente da câmera, fazendo comentários importunos com o microfone aberto, familiares circulando pela casa de pijama ou de roupão, etc. Eles certamente renderiam um livro bem divertido quando tudo isso passar.
Lembre-se de que o seu comportamento é o seu grande diferencial em qualquer lugar, no mundo físico ou no mundo virtual.
Em primeiro lugar vale destacar que não tínhamos em nosso currículo nenhum curso de capacitação para utilizar e tirar o melhor proveito das diversas plataformas disponíveis atualmente. Fomos aprendendo tudo na hora, de forma muitas vezes intuitiva, já com o jogo em andamento. Quando estamos nos habituando a uma delas, chega um cliente novo que prefere outra plataforma e por mais que todas elas tenham um funcionamento parecido, não faltam funções, variações e sutilezas que precisam ser testadas, aprendidas e treinadas.
Toda preparação é sempre bem-vinda. Seja de si mesmo, ao cuidar da sua aparência, dos seus materiais e dos seus itens de necessidade, como água, um chá ou um cafezinho. Seja do seu ambiente, ao cuidar do local, da luminosidade, da privacidade e de uma acomodação confortável. Seja dos seus recursos, ao testar a plataforma e a sua conexão de internet com antecedência. Você já deve ter experimentado o estresse de estar numa videoconferência na qual a qualidade da conexão não é boa, o áudio não funciona, a imagem fica congelada, dentre outros inconvenientes.
Se liga e ligue a câmera. Tenho observado que durante as videoconferências poucas pessoas tem o hábito de deixar a câmera ligada. Sabemos que estar diante de uma câmera é um fator inibidor para muita gente e as pessoas não estão acostumadas a estar na tela. Elas nem sempre se tem a privacidade necessária ou um ambiente tido como “ideal”. Mas alguns pontos merecem a nossa atenção.
Se no grupo, alguns deixam a câmera ligada e outros desligada, cria-se uma espécie de dinâmica desigual. Isto é, as pessoas que estão com câmera ligada começam a se questionar porque elas são as únicas a seguir esse padrão; começam a pensar no que os outros podem estar fazendo simultaneamente àquela atividade e onde estaria o verdadeiro foco de atenção das pessoas.
Esses pensamentos são altamente distrativos e, por consequência, diminuem o seu grau de concentração com o momento presente e podem gerar algum tipo de retrabalho. Sem contar ainda que, para quem está apresentando é muito importante receber um feedback da sua audiência, mesmo que seja mínimo, algo que fica completamente nulo quando a câmera está desligada. É como se você virasse de costas para quem está falando numa reunião presencial e eu tenho certeza de que você jamais faria isso.
Quando todos no grupo estão com as câmeras ligadas cria-se um nivelamento que favorece o engajamento das pessoas com o assunto que está sendo discutido. Os apresentadores podem coletar aquilo que chamamos de sinais honestos de comunicação, advindos da linguagem corporal e, desta forma, monitorar o clima e a qualidade da sua fala. Digo isso por experiência própria, pois atualmente todos os meus treinamentos estão sendo ministrados por vídeoconferência e é bastante incômoda a sensação de estar falando para uma tela cheia de iniciais ou “bolinhas” com a foto das pessoas.
Essa situação é ainda mais evidente quando se trata de uma conversa individual, como por exemplo uma reunião de alinhamento ou feedback. Manter a câmera ligada nessas ocasiões faz toda a diferença para os resultados.
Você também se beneficia do efeito “vídeo ativo”, pois inconscientemente se cobra mais para cuidar da postura e do foco no que está acontecendo, ajudando seu cérebro a manter a concentração e gerenciar melhor as distrações presentes no seu ambiente.
Desta forma, ao iniciar uma videoconferência, sugira esse padrão ao grupo, apontando essas evidências e mantenha sua câmera ligada para dar o exemplo. Talvez no início nem todos se manifestem a favor, mas com o tempo e a repetição o hábito vem.
Adesão total aos fones de ouvido. A utilização de fones de ouvido otimiza os recursos que são utilizados para as videoconferências. Eles minimizam ecos, interferências e combatem aquele círculo vicioso de ruídos causado pelo conflito constante entre os microfones e os alto-falantes do seu equipamento, fazendo com que o som e a escuta fiquem mais qualificados e agradáveis para todos.
Eles nos ajudam a minimizar também outras interferências presentes no ambiente e imediações, como por exemplo, os ruídos do trânsito, da cozinha, da obra ao lado, do cachorro latindo e da criança chorando. Como disse anteriormente, essa não é a real experiência de home-office, nossos espaços e horários estão sendo compartilhados com as atividades da família toda no mesmo ambiente.
Para ficar melhor ainda, lembre-se de silenciar seu microfone quando não estiver falando. Isso pode parecer óbvio, mas muita gente se esquece desse detalhe e acaba comprometendo a experiência de todos.
Planeje antes o espaço para a interrupção. Faça pausas intencionalmente depois de falar algumas frases e dê a chance para as pessoas se manifestarem enquanto você fala. Às vezes pela ânsia de terminarmos logo uma reunião on-line, acabamos falando tudo de uma vez e rápido demais, alimentando a expectativa de que não devemos ser interrompidos e que os comentários são mais indicados ao final. Acontece, porém, que ao final todos já estão cansados e pensando no próximo compromisso da agenda, o que desestimula a participação e acaba reforçando esse afastamento compulsório que estamos vivendo.
Está aqui mais um ponto que pode (e deve) ser combinado e estimulado com o grupo até que se torne um hábito, pois à medida que abrimos espaço para uma maior interação, a coesão do grupo aumenta e favorece o senso de pertencimento.
Menos é mais. Se for possível, limite o número de vídeoconferências. Muitas vezes, no contexto das empresas as pessoas passavam o dia todo emendando uma reunião na outra. Entretanto no formato on-line essa experiência demanda muito mais energia e gera muito mais cansaço. Participar de uma videoconferência vai muito além de ter disponibilidade na agenda e uma boa conexão. São necessários outros arranjos, como por exemplo, realocar as pessoas da família em outros ambientes da casa, conseguir alguém para cuidar das crianças pequenas e deixar as refeições encaminhadas anteriormente.
Eu acredito que a pandemia acabou acelerando alguns aspectos que já estavam previstos para o tão famigerado “futuro do trabalho” e que, passado esse início tão abrupto e turbulento, muitas coisas vão se acomodar e permanecer no nosso cotidiano.
O trabalho remoto é uma delas. E junto com todos os benefícios que ele pode nos trazer, é preciso ressaltar que as suas principais premissas envolvem dar liberdade às pessoas, respeitando seu tempo, atenção e espaço.
Um grande abraço e até breve...
Mestre em Administração com Foco em Gestão e Inovação Organizacional e Especialista em Gestão de Pessoas pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS.
Psicóloga pela Universidade Metodista de São Paulo.
Executive & Life Coach em nível Sênior, com formação internacional pelo ICI (Integrated Coaching Institute) em curso credenciado pela ICF (International Coach Federation).
Professora convidada dos programas de pós-graduação da FGV/Strong, Universidade Metodista e Senac, dos programas de MBA da Universidade São Marcos e Unimonte, e dos cursos FGV/Cademp, para a área de Gestão de Pessoas. Professora conteudista do Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos – UNIFEOB.
Atua há mais de 19 anos com Gestão de Pessoas em diversas empresas e segmentos, dentre elas Wickbold, Bridgestone, Bombril, Solar Coca-Cola, Porto Seguro, Grupo M. Dias Branco, Prensas Schuler, Arteb, Grupo Mardel, Tegma, Pertech, Sherwin-Williams, Grupo Contax, Grupo Libra, Grupo Sigla, Unilever, Engecorps, Nitro Química, Grupo Byogene, Netfarma, NTN do Brasil e Toyota.
Em sua trajetória profissional e acadêmica, já desenvolveu mais de 17.500 pessoas, com uma média de avaliação superior a nota 9,0 em todos seus treinamentos.
Palestrante, consultora de empresas e autora de diversos artigos acadêmicos publicados em congressos e revistas.
Colunista da revista Manufatura em Foco – www.manufaturaemfoco.com.br
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