Exclusiva

Qual o papel do governo no desenvolvimento dos laboratórios de manufatura?

Na última reportagem da série exclusiva CIMM Laboratórios de Manufatura e a Tríplice Aliança, mostramos como os incentivos governamentais são importantes para a modernização e avanço da indústria brasileira através dos laboratórios de manufatura

Nesta série especial sobre laboratórios de manufatura no Brasil, mostramos a importância do modelo de hélice tríplice para o desenvolvimento do setor e da inovação da indústria brasileira. Entre os destaques, estão as parcerias entre empresas e universidades públicas e privadas no desenvolvimento de tecnologias. Mas a atuação do poder público na área pode ir além do fortalecimento das universidades federais. Entidades representativas do setor acreditam que fortalecer atividades de inovação precisa estar entre as prioridades dos governos.

Em 2022, a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) lançou o documento “Reconstruindo a Indústria: Uma proposta da indústria brasileira de máquinas e equipamentos”, que foi entregue aos candidatos e candidatas à Presidência da República para a agenda de governo do mandato de 2023 a 2026. Nele, a entidade afirma, entre outros pontos, que “a Indústria 4.0 é o novo paradigma tecnológico que se apoia na transformação digital da produção de forma intensiva, para tornar as fábricas mais flexíveis e eficientes, ao permitir maior velocidade, menor custo e níveis mais elevados de qualidade para realização de uma produção dotada de um alto nível de customização em massa”.

No documento, a Abimaq defende que “este novo modelo de produção requer a implementação de tecnologias sofisticadas com digitalização de processos, sensoriamento eletrônico, internet das coisas, computação em nuvem, uso de big data e algoritmos para sua análise”, e complementa afirmando que “todas essas tecnologias implementadas no âmbito das empresas necessitam de uma infraestrutura digital nacional em banda larga, rede de fibra ótica e rede móvel para que as transmissões de grandes volumes de dados ocorram em alta velocidade e num ambiente de cyber security”.


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Com isso, a associação enfatiza que a atuação do governo brasileiro, a exemplo do que ocorre em outros países, é essencial para a adoção ampla do novo paradigma pela indústria nacional, e faz a seguinte indicação: “Em um papel de coordenação e incentivador, requer-se a criação de um Plano Nacional de Indústria 4.0, dotado de uma visão estratégica de longo prazo, por meio de um diálogo envolvendo os atores críticos do setor privado, conectando pessoas, recursos, políticas e organizações de modo a que seus esforços visem a resolução de problemas e desafios efetivos presentes no ambiente econômico brasileiro”.

Entre as diretrizes deste plano, está estabelecido que deve fortalecer atividades de inovação nas empresas industriais brasileiras com foco em tecnologias habilitadoras para manufatura avançada.

Apoio de órgãos de fomento

Pesquisadores que atuam na área também defendem incentivos do governo. O coordenador da Fábrica do Futuro da USP e professor da Escola Politécnica da universidade, Eduardo Zancul, afirma que políticas públicas podem fomentar a Indústria 4.0 com a formação de mão de obra especializada no país. “A Fábrica do Futuro é um laboratório de uma universidade pública que recebeu recursos de um edital interno da USP, e depois da ABDI [Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial], e esses recursos foram fundamentais para a montagem, estruturação de projetos e oferecimento dos cursos de qualificação. Complementar a isso, sempre foi muito importante a parceria com empresas. Sem isso, nós também não teríamos chegado ao nível de desenvolvimento que chegamos”, avalia.

Ulisses Borges Souto, coordenador do Labman da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) segue a mesma linha: “Acredito que os órgãos de fomento público podem apoiar mais as iniciativas e custeio dos laboratórios das universidades públicas, pois muitas pesquisas realizadas nestes locais podem não ter um interesse imediato para a iniciativa privada, mas geram conhecimento para serem aplicados posteriormente e preparam novos pesquisadores”.

Como o Brasil tem avançado no setor

Em 2016, o governo federal lançou a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI), com ações previstas até 2022. Entre elas, o Ministério da Ciência e Tecnologia propôs a instauração de um paradigma de inovação colaborativa no Brasil, estimulando o estreitamento das relações entre universidades e empresas e a interação entre os mais diferentes componentes do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI).

A partir disso, o ministério lançou o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação para Tecnologias Convergentes e Habilitadoras, Volume IV – Manufatura Avançada, com um conjunto de desafios, metas, ações e estratégias de implementação para o período compreendido entre os anos de 2016 a 2022.

Já em 2017, o MCTI conduziu um conjunto de eventos no Brasil que reuniram diversos especialistas da academia, setor privado, governo e outros setores, para discutir as oportunidades para o país na era da Indústria 4.0. Os principais resultados desta iniciativa foram sintetizados no Plano de CT&I para Manufatura Avançada no Brasil, Pró-Futuro – Produção do Futuro.

Em 2019, foi formalizada a Câmara Brasileira da Indústria 4.0 (Câmara I4.0), integrada por um Conselho Superior, Secretaria Executiva e Grupos de Trabalho (GTs), com funções de gestão e governança. Ainda naquele ano, a Câmara apresentou um Plano de Ação que objetiva ser um instrumento indutor do uso de conceitos e práticas relacionados à indústria 4.0, visando o aumento da competitividade e produtividade das empresas brasileiras, contribuindo para inserção do Brasil nas cadeias globais de valores e, consequentemente, melhorando sua posição em índices globais de competitividade.

Também em 2019, o Plano Nacional de Internet das Coisas foi instituído pelo Decreto nº 9.854, com o objetivo de implementar e desenvolver esta área no país, com base na livre concorrência e na livre circulação de dados, observadas as diretrizes de segurança da informação e de proteção de dados pessoais. Sua elaboração ocorreu a partir de uma parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o Banco Nacional do Desenvolvimento.

 Em 2021, o governo federal inaugurou o primeiro Centro de Excelência MCTI em Tecnologia 4.0, em Sorocaba. Imagem: Divulgação/Prefeitura de Sorocaba

Dois anos depois, o governo federal inaugurou o primeiro Centro de Excelência MCTI em Tecnologia 4.0, em Sorocaba, pioneiro no Brasil no conceito “hélice quíntupla”, que une conhecimento e inovação, estimulando o desenvolvimento tecnológico, especialmente baseado em Internet das Coisas (IoT) e robótica. Criado no âmbito do Plano Nacional de IoT e da Estratégia Nacional para a Transformação Digital, o centro foi integrado ao Parque Tecnológico de Sorocaba, numa parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), o governo federal e a Prefeitura de Sorocaba.

Em 2022, o MCTI e a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) destinaram R$ 27,8 milhões para projetos de inovação com a indústria, por meio da seleção de oito centros de pesquisa.O investimento está sendo aplicado nas áreas de Internet das Coisas (IoT), Manufatura 4.0, Tecnologias 3D; Biotecnologia aplicada à Micropropagação de Culturas Vegetais e Processos Metalúrgicos Extrativos e Biotecnológicos. 

Atualmente, o governo federal elabora o Plano de Execução da Estratégia Industrial, Verde e Tecnológica (Eivtec), principal orientador das políticas públicas a serem desenvolvidas para a retomada da industrialização brasileira nos próximos 10 anos. O plano é elaborado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

Segundo a secretária de Competitividade e Regulação do MDIC, Andréa Macera, “a estratégia tem plano de ação bienal, até 2030, e ela dá previsibilidade e segurança, mas é flexível o suficiente para incorporar algumas das novas temáticas que a economia e a sociedade brasileira exigem, como, por exemplo, a economia verde e a economia digital”.

Confira a série completa aqui!