Caoa Chery terá duas plataformas no Brasil

Cada uma dará origem a SUVs e sedãs feitos em Anápolis e Jacareí.

Após anunciar há 10 dias a compra de metade das operações da Chery no Brasil e se tornar sócio da montadora chinesa, o Grupo Caoa começa a esclarecer como o negócio será administrado daqui por diante. Sem revelar ainda exatamente quais e quantos modelos Caoa Chery pretende lançar, a empresa confirma que sedãs e SUVs da nova marca começam a chegar ao mercado brasileiro em 2018 e vão ser construídos sobre duas plataformas modulares, uma mais compacta em Jacareí (SP), que abriga a fábrica da Chery inaugurada em 2014, e outra maior em Anápolis (GO), onde há 10 anos a Caoa monta veículos da coreana Hyundai e que ganhará mais uma linha de produção separada para fazer os carros do novo sócio. 

“Vamos precisar usar as duas fábricas para atingir nossa meta de obter 5% de participação no mercado brasileiro nos próximos cinco anos, mais as exportações para toda a América do Sul que poderão chegar a 20% da produção”, explica Mauro Correia, presidente do Grupo Caoa. Se o volume de vendas de veículos no Brasil voltar ao patamar de 3 milhões de unidades/ano nesse período, significa que a Caoa Chery venderá 150 mil carros/ano caso alcance seu objetivo, e a este número podem ser somados 30 mil a 40 mil exportados. 

Por essa conta, os 180 mil a 190 mil modelos Caoa Chery produzidos seriam suficientes para preencher as capacidades ociosas de ambas as plantas. A Chery pode fazer atualmente em Jacareí 50 mil unidades/ano em um turno, mas o projeto original já previa 150 mil em uma segunda etapa de investimento. Já em Anápolis a Caoa tem potencial para 80 mil/ano da Hyundai, porém com as novas instalações para fabricar os Caoa Chery esse número pode variar. “Lá vamos precisar de mais uma linha de montagem de carrocerias”, esclarece Correia. 

Sobre as diversas greves que já aconteceram na Chery de Jacareí e relacionamento de conflito estabelecido com o sindicato local, Correia avalia que esse “é um dos riscos do negócio e que eventualmente podem criar dificuldades a novos investimentos, mas não vamos deixar de investir por causa disso”. Segundo Luis Curi, vice-presidente da Chery Brasil e à frente dos negócios da chinesa no País desde a chegada da marca em 2009, “independentemente do sindicato, é preciso dizer que os funcionários receberam muito positivamente o negócio [com a Caoa], porque acreditam que isso garante o futuro da fábrica”, diz. 


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Produtos

Um ano atrás, quando já conversava com a Caoa sobre a possível associação (as negociações começaram em abril de 2016), a Chery havia prometido iniciar a produção de três SUVs no Brasil entre este ano e o próximo, começando pelo compacto Tiggo 2 (presentado no último Salão de São Paulo) e seguindo em ordem crescente de tamanho para os Tiggo 7 e 9. Correia não confirma se esse plano será mantido: “Avaliamos fazer diversos SUVs e sedãs da Chery, mas não vamos adiantar quais serão por causa da concorrência”, diz. 

Correia reconhece que os três Tiggo foram avaliados, “mas talvez não sejam exatamente esses, porque precisa respeitar também o ciclo (de vida) de cada produto, a Chery está fazendo muitos projetos”, explica, deixando a entender que possivelmente modelos ainda não lançados na China poderão desembarcar por aqui, como por exemplo o novo SUV Exeed TX, apresentado ainda como protótipo para o mercado europeu no último Salão de Frankfurt, em setembro. 

“Foi a proposta de produtos que a Chery prepara que nos convenceu a fazer a sociedade no Brasil. Eu e Márcio Alfonso (diretor de engenharia da Caoa) fomos várias vezes à China [durante as negociações] e ficamos muito bem impressionados com o elevado grau de equipamentos de segurança, conectividade de última geração e opções modernas de motorização que vimos”, endossa o executivo. Ele adianta que os carros que vão usar a marca Caoa Chery “vão oferecer design atraente, grande conteúdo tecnológico e qualidade por preços competitivos, mas não agressivos”, destaca. “Os clientes terão acesso a produtos modernos com bom conteúdo por valores atraentes.” 

Todos os produtos da nova marca vão passar por adaptações locais com cooperação entre Chery e Caoa – que aumentou expressivamente sua capacidade de engenharia após a inauguração este ano de um moderno centro de pesquisa e desenvolvimento de 4 mil metros quadrados ao lado da fábrica de Anápolis, onde foram investidos R$ 121 milhões. Estão confirmados investimentos em localização de componentes e ferramentais, mas ao menos de início as partes estampadas da carroceria continuarão a ser importadas da China. Os modelos da Chery produzidos atualmente em Jacareí têm baixo índice de nacionalização: o Celer hatch e sedã usam apenas cerca de 25% de partes nacionais e o compacto QQ ainda menos, em torno de 20%, segundo Curi. 

Negociação, investimento e rede

Para Curi, o salto de tecnologia e design que a montadora preparou nos últimos anos foi o principal catalisador da associação com a Caoa. “São duas metades perfeitas de uma laranja. Tínhamos toda a tecnologia que a Chery pode oferecer hoje, mas faltava a força do marketing e da distribuição, algo que a Caoa tem de sobra”, diz, em referência às quase duas centenas de concessionárias das marcas Ford, Subaru e Hyundai que fazem do grupo o maior distribuidor de veículos da América Latina. “Por isso desde o início sempre fui um incentivador do negócio, que dá nova força à Chery e tem enorme potencial de crescimento no Brasil e toda a América do Sul”, conta Curi, que pessoalmente iniciou as negociações com a Caoa em abril de 2016. 

Os dois executivos, Curi e Correia, garantem que nunca houve desistência do negócio por nenhuma das partes, como chegou a ser noticiado. “O que houve foram períodos de altos e baixos com maior ou menor atividade. Foi até muito rápido para uma negociação desse tamanho que envolve tantas avaliações e decisões”, diz o presidente da Caoa, que confirma o pagamento de US$ 64 milhões pela participação de 50% na Chery Brasil, conforme comunicado pela bolsa de valores chinesa. 

O valor é quase nada diante dos US$ 2 bilhões que a Caoa Chery promete investir nos próximos cinco anos, valor suficiente para fazer até três fábricas novas – a Chery informa ter investido US$ 600 milhões para se instalar sua unidade em Jacareí. Segundo Correia e Curi, em princípio os aportes serão feitos com caixa próprio das duas empresas. Eles também esclarecem que tudo que for investido na fábrica de Jacareí e no desenvolvimento de novos produtos será dividido entre Chery e Caoa, enquanto os investimentos na planta de Anápolis, concessionárias e marketing ficam por conta da Caoa, que assume a administração de toda a operação. 

Um abrangente trabalho de construção da marca Caoa Chery terá de ser feito, com investimento em imagem e uma nova rede de revendas. Com 60 mil carros vendidos no País desde 2009, a Chery foi prejudicada pela sobretaxação aos veículos importados trazida pelo Inovar-Auto a partir de 2012, suas vendas caíram do pico de 21,7 mil unidades em 2011 com 108 concessionárias para cerca de 3 mil este ano em apenas 22 pontos de venda em operação. “Faremos uma rede completamente nova [separada das lojas Ford, Subaru e Hyundai do grupo], muito focada em serviços”, diz Mauro Correia. Ele concorda que para atingir a participação de 5% do mercado brasileiro “com certeza vamos precisar de mais de 100 concessionárias”. 

Caoa Hyundai

Correia garante que o negócio com a Chery não abala a relação do Grupo Caoa com a Hyundai, de quem é importador exclusivo no Brasil, produz cinco modelos sob licença em Anápolis e também é o maior concessionário, inclusive dos carros produzidos no País pela coreana em Piracicaba (SP). “Nada muda. Temos ótima relação com a Hyundai, é um grande parceiro, são fantasiosas as notícias de que a sociedade com eles vai acabar”, afirma. Segundo o executivo, antes de assinar contrato com a chinesa a Hyundai foi avisada e não houve oposição. 

“Tratamos os negócios de forma separada. Cada marca que representamos (Hyundai, Subaru e Ford) tem uma diretoria com objetivos específicos e o mesmo vai ocorrer com a Chery. Não queremos canibalizar marcas e produtos. Nós nunca vamos competir contra nós mesmos”, garante.