Caminhões e máquinas agrícolas na contramão dos investimentos

Enquanto indústria teme efeitos da redução dos recursos do BNDES, setor automotivo espera crescimento com safra recorde.

A piora das condições de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), dentro do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), anunciadas na quarta-feira pelo governo, aumentou o pessimismo de boa parte da indústria para 2014. O banco encerra hoje as aprovações pelas taxas de 2013, mas a rede associada já não aceita pedidos pelo PSI há alguns dias, por uma questão de prazo.
 
Ancorados na previsão de uma safra agrícola recorde no próximo ano, entretanto, a exceção são os fabricantes e comercializadores de caminhões e de máquinas agrícolas. Ao contrário dos demais setores, empresas desses dois segmentos e também a Associação Nacional de Veículos Automotores (Anfavea) comemoraram a extensão do PSI para 2014. Mesmo com as mudanças nas condições, eles preveem investimentos em patamares altos para o ano que vem.
 
A Federação Nacional das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) diz basear-se em cenários econômicos sólidos para não ser tão otimista e discorda da previsão das empresas dos segmentos de caminhões e máquinas agrícola. A indústria paulista como um todo projeta um ano novo mais difícil do que o que passou.
 
Para os produtores de bens de capital, representados pela Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), tudo vai depender do orçamento do PSI para o próximo ano, ainda não divulgado. Se for menor que os R$ 80 bilhões deste ano, o que se espera é uma corrida das empresas para garantir o seu quinhão ainda no primeiro semestre, o que Carlos Pastoriza, diretor-secretário da Associação considera um “desastre”. “Isso não é bom para o país. Levaria a demissões no segundo semestre”, afirma.
 
José Ricardo Roriz Coelho, diretor de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, ressalta que, mesmo em 2013, com o PSI em condições mais favoráveis do que as do próximo, o investimento ficou abaixo do necessário para garantir um crescimento da economia na casa de 5%. “O ano que vem é cheio de incertezas em relação ao crescimento e ao custo de produção. A notícia de piora das condições do PSI é, certamente, ruim”, diz Coelho. Ele acrescenta que a indústria deverá fechar 2013 com um caixa minguado, com pouco capital para investimento próprio, e que, além do aumento das taxas de crédito, a redução do limite de participação do banco nos projetos soou especialmente mal entre os produtores.
 
Essa não é, contudo, uma visão homogênea no mercado. A simples perspectiva do anúncio de alterações no PSI neste fim de ano motivou vendas recordes da rede Auto Sueco São Paulo, de concessionárias de caminhões e ônibus da Volvo, que atende produtores, sobretudo agrícolas, na Grande São Paulo, no Vale do Paraíba, em Campinas e na Baixada Santista. Para 2014, as perspectivas são ainda mais otimistas, de crescimento de 10% no comércio geral e de 20% para caminhões semipesados, utilizados no transporte de mercadorias destinadas ao mercado interno. “A expectativa por alterações no PSI para o ano que vem impulsionou a antecipação de negócios de clientes, que se aproveitaram das taxas mais baixas do mercado”, conta Luís Gambim, diretor Comercial da empresa. Foram vendidos no mês 256 caminhões, 76% mais do que em outubro. E, para atender ao crescimento da demanda, foi necessário recorrer à fabricante Volvo , segundo Gambim.
 
Em 2013, os caminhões pesados, utilizados na logística de grãos para exportação, seguraram as vendas da rede concessionária, que cresceram 10% comparado ao ano anterior. Mas, em contrapartida, o comércio dos semipesados caiu 10%, por isso a previsão de que esse segmento irá segurar a alta das vendas no ano que vem. Além disso, a empresa conta com a ajuda da realização da Copa do Mundo e das eleições para impulsionar os negócios. “Esperamos um esforço maior do governo para incentivar a produção. Juros de 0,5% ao mês (para caminhões, no PSI) são o mesmo que a inflação”, ressalta Gambim.
 
Uma das líderes nacionais na fabricação de máquinas agrícola, a Marssey Ferguson também aposta em um 2014 de expansão, embora não no mesmo nível de 2013. A expectativa é que a produção alcance o patamar de 2012, bastante positivo, segundo Carlito Eckert , diretor Comercial da empresa. “O ano de 2013 foi um ponto fora da curva, de recordes, com antecipações de compras. E muitos contratos fechados no fim de 2012, com condições ainda mais favoráveis de PSI, acabaram sendo entregues neste ano, o que favoreceu o resultado”, aponta Eckert. Ainda assim, ele vê espaço para a continuidade do processo de renovação da frota agrícola, sobretudo de tratores.
 
O próximo ano deve ser favorecido pelo aumento da renda do produtor de grãos, obtido em 2013, e pela valorização das commodities agrícolas, diz ele. A previsão é que, em vez das 65 mil unidades comercializadas neste ano, sejam vendidas 55 mil unidades no próximo, um volume expressivo, de acordo com o executivo. “O Brasil vive um período de atualização da frota por máquinas maiores e mais modernas. Tudo o que o produtor agrícola quer é aumentar a produtividade, aproveitando o momento certo de plantar e de colher”, destaca Eckert, para quem há espaço no mercado para o crescimento das vendas, mesmo após um ano de fartura.
 
O otimismo da Volvo Auto Sueco São Paulo e da Marssey Ferguson estão refletidos também nas projeções da Anfavea. “Aplaudimos a prorrogação do PSI para 2014. As novas taxas são adequadas para os investimentos necessários ao Brasil”, comemora o presidente da Associação, Luiz Moan.
 
Para o diretor da Fiesp, entretanto, os investimentos previstos em infraestrutura, mesmo aqueles impulsionados pelas concessões que estão sendo realizadas pelo governo, não são suficientes para garantir uma Formação Bruta do Capital Fixo (FBCF) elevada em 2014. “Pode ser que a produção de caminhões e máquinas agrícolas não sinta tanta dificuldade. Mas, por outro lado, os fabricantes de máquinas e equipamentos serão diretamente afetados pela piora das condições de crédito”, afirma Coelho. Diante das mudanças no PSI, a Federação projetou um crescimento da FBCF de 2,4% em 2014, uma desaceleração ante os 6,3% estimados para este ano.
 
Por Fernanda Nunes/ Brasil Econômico

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