Metalúrgicos querem contrato coletivo nacional

Principal obstáculo é a diferença do piso salarial. No ABC, o piso é 131% maior que o do metalúrgico em Manaus.

Os metalúrgicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT) traçaram uma estratégia e já deram os primeiros passos para a elaboração de um Contrato Coletivo Nacional (CCT), como é feito pelos bancários. No fim de 2012, foi elaborada uma pauta comum durante a 1ª Conferência Nacional de Negociação Coletiva dos metalúrgicos cutistas, que estabeleceu cinco cláusulas sociais a serem abordadas neste ano por todas as suas bases durante as negociações.

No entanto, a diferente realidade que cerca os 2,4 milhões de trabalhadores da categoria no país é a principal barreira ao CCT. No ABC, por exemplo, o piso salarial do montador é 131% maior que o piso do metalúrgico que exerce a mesma função em Manaus.
 
A elaboração de um contrato nacional dos metalúrgicos já foi buscada em outros momentos pela CUT. Porém, dirigentes da central dizem que, agora, as próprias empresas veem a necessidade de desburocratizar as negociações, o que diminui parte da resistência a esse movimento e abre espaço para que os sindicatos se organizem. Pouco a pouco, eles devem incluir outras questões comuns nas pautas de suas bases. Dessa maneira, as diferenças regionais serão diminuídas, o que facilitará a elaboração de uma pauta nacional unificada, inclusive com questões econômicas, nos próximos anos.
 
Ao mesmo tempo, os trabalhadores ganharam força com baixas taxas de desemprego e dificuldade de encontrar mão de obra qualificada. "Há 20 anos tentamos estabelecer esse acordo, mas vivíamos em período de baixo crescimento e desemprego alto. Isso mudou. Estamos no melhor momento para negociar", diz Paulo Cayres, presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM) da CUT.
 
Sérgio Nobre, secretário-geral da central sindical e ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, diz, sem citar nomes, que já foi procurado por indústrias presentes em diferentes Estados, que demonstraram interesse em uma negociação unificada. "Existe um debate na indústria sobre a complexidade da gestão de relações do trabalho. Com o aumento da competitividade, as empresas querem desburocratizar esse processo."
 
Os 781 mil metalúrgicos da CUT, que representam mais de 30% da categoria no Brasil, escolheram cinco pontos para discutir em todas as negociações no país. Auxílio para creche, acesso dos sindicatos ao local de trabalho, formação das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipa), acompanhamento dos sindicatos nas demissões e controle da jornada de trabalho serão debatidos com os sindicatos patronais da categoria.
 
Alguns deles, como a fixação de uma jornada, parecem óbvios para os metalúrgicos em locais com sindicatos representativos, como em São Paulo, mas se tornam exceção em locais mais afastados dessa realidade. "Queremos estabelecer essas garantias em todo o país. A realidade dos metalúrgicos do Norte e Nordeste precisa ser equalizada com a dos demais", diz Cayres.
 
A maior barreira à negociação nacional é a equiparação dos salários. Enquanto o piso de um metalúrgico que trabalha como montador no ABC é de R$ 1.560, o trabalhador nas mesmas condições em Manaus recebe R$ 675 e, em Pernambuco, R$ 716. A diferença passa de 130%. O salário médio dos metalúrgicos do ABC, que está em R$ 4,1 mil, também é muito maior que a média nacional dos metalúrgicos cutistas, de R$ 2,5 mil. Na região estão concentradas cinco grandes montadoras, que elevam a média salarial da categoria.
 
"A categoria metalúrgica tem a indústria automobilística como principal ramo, e o carro é vendido ao mesmo preço em todo o país, não há diferenciação regional. Por que os salários pagos para os mesmos trabalhadores têm tamanha diferença?", diz Nobre, da CUT.
 
As cláusulas econômicas ainda não foram consideradas entre os primeiros pontos que os metalúrgicos da CUT incluíram na pauta a ser negociada individualmente, neste ano, pelos seus sindicatos. O motivo é evitar qualquer resistência das organizações patronais, antes que seja garantida a igualdade entre condições sociais básicas da categoria, como a delimitação da jornada - que hoje está, na maior parte do país, em 44 horas. A redução para 40 horas, que já vale para 80% dos metalúrgicos do ABC, entra com força nessa pauta unificada mais para frente.
 
"Não queremos que a discussão de salários e pisos iniba as negociações. Antes precisamos garantir, por exemplo, a presença do sindicato nas fábricas para que tentemos diminuir os acidentes de trabalho, o que ainda ocorre com muita frequência em determinadas bases", diz Cayres.
 
Quem pode dar força a esse movimento são os metalúrgicos da Força Sindical. Apesar de menos representativos, eles são mais numerosos e chegam a cerca de 1,4 milhão no país, sendo 800 mil apenas no Estado de São Paulo. Cláudio Magrão, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos da Força, afirma que a discussão de uma negociação nacional deve começar a ganhar forma em 2013.
 
"Isso vem sendo cogitado há muitos anos, mas faltava organização das centrais. Neste ano, essa discussão tem de ser prioridade", diz Magrão. Segundo ele, a Força ainda não se juntou à CUT, porque espera uma maturação da negociação nesses moldes dentro das bases cutistas.
 
Magrão pondera que os setores patronais dos metalúrgicos devem oferecer forte resistência a essa organização e sugere que as negociações unificadas no país ocorram, ao menos inicialmente, em empresas localizadas em mais de um município. "É improvável que o contrato nacional dos metalúrgicos dê certo. Há grande complexidade entre as empresas e a realidade dos Estados", diz.
 
Cayres, da CNM-CUT, concorda que esse pode ser o passo inicial. Ele cita o caso da Ford. Na empresa, o piso dos metalúrgicos em Camaçari é menor do que o pago em São Bernardo do Campo, mas houve uma negociação em que ficou determinado que a participação sobre os lucros seria igual, independentemente da unidade onde se trabalha.
 
Otávio Pinto e Silva, sócio do escritório Siqueira Castro Advogados, também vê uma série de empecilhos a esse modelo de negociação para os metalúrgicos. "Encontramos diferentes condições de trabalho e custo de vida. Seria importante que houvesse negociações menores, que adaptassem o contrato nacional à realidade local, partindo de parâmetros básicos para todo o país."
 
Essa dificuldade foi superada pelos bancários, já que os bancos têm presença nacional, são menos numerosos e mais homogêneos que as empresas metalúrgicas. Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), que representa 500 mil bancários no país, a negociação é simultânea com cerca de 150 bancos, representados pela Federação Nacional dos Bancos (Fenaban). "Não temos a menor dificuldade de fazer um protesto que reúna trabalhadores de todo o país", diz Miguel Pereira, diretor da Contraf.
 
Por Carlos Giffoni/ Valor Econômico