Direto da universidade para o centro de pesquisa

Indústrias criam estratégias para atrair e manter profissionais em seus centros de P&D

Se por um lado as empresas estão preocupadas em investir em seus centros de P&D em busca de maior competitividade e diferenciação no mercado por meio da inovação, por outro, profissionais saem das universidades de olho na oportunidade de trabalhar com pesquisa dentro das indústrias. Esse casamento está dando certo. Em muitas empresas, quase a metade do pessoal da pesquisa é pós-graduada e uma parte detém o diploma de mestrado ou doutorado.

Apesar do crescente interesse entre indústrias de alta tecnologia e pesquisadores, esses profissionais não chegam prontos para as funções dentro dos centros de pesquisa. Para prepará-los e formar equipes adequadas às suas necessidades, as companhias investem em programas para estimular os estudos avançados não apenas entre os profissionais que estão chegando, mas também entre os colaboradores interessados em atuar na área.
 
"Nosso Programa de Desenvolvimento Individual (PDI) mapeia a necessidade de capacitação de cada um e investe nos treinamentos necessários seja em cursos de MBA, mestrado ou doutorado, assim como em cursos para softwares, idiomas ou o que for necessário", diz Calalberto Podda, diretor de Recursos Humanos da FPT Industrial América Latina, do Grupo Fiat Industrial, especializada em design, produção e comercialização de sistemas de propulsão para veículos.
 
Cerca de 70 pessoas trabalham no Centro de Desenvolvimento da FPT Industrial na América Latina, a maioria engenheiros de diferentes áreas. Do total, 40% fizeram pós-graduação e 10% mestrado. Localizado em Betim (MG), o centro é considerado, segundo ele, referência não só para outras unidades da FPT no mundo como ainda para clientes e mesmo para concorrentes.
 
Parte do valor investido nos cursos é pago pela empresa. Além do PDI, a FPT treina seus colaboradores em seu principal centro de P&D, na Itália. "Dessa forma, podem aprender as melhores práticas na área em que vão atuar e se tornam especialistas", diz.
 
Até pouco tempo atrás a situação era diferente na área de pesquisa, lembra o diretor. Poucos profissionais recém-formados, segundo ele, passavam a atuar efetivamente na área de engenharia de desenvolvimento. "Hoje em dia, esta visão está mudando e os engenheiros que acabam de sair da faculdade procuram mais a área da pesquisa", relata. A maior valorização desses profissionais pela indústria e o retorno financeiro nesta área estão fazendo com que eles se redirecionem para atuar na engenharia.
 
O aumento dos investimentos em pesquisa para oferecer produtos diferenciados se reflete na expansão também da equipe com alto nível de qualificação da Braskem. Entre 2008 e 2011, o número de integrantes passou de 176 para 293. Do total, 45% são pós-graduados, 15% mestres e 25% doutores. Além de contratar estagiários para os laboratórios de P&D no Brasil e no exterior, a companhia oferece bolsas de mestrado e doutorado e desenvolve projetos em universidades brasileiras e estrangeiras, informa o diretor de Inovação e Tecnologia, Luís Cassinelli.
 
Muitos dos participantes desses programas acabam se tornando pesquisadores da Braskem. A empresa usa ainda o programa Ciências sem Fronteiras, parceria entre os ministérios da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI) e Educação (MEC), criado para internacionalizar a ciência e a inovação brasileira. Por esse programa, a empresa treina três pessoas nos Estados Unidos. "Os colaboradores, principalmente da área de P&D são incentivados a realizar doutorado", afirma.
 
Cassinelli lembra que houve uma época em que bancos e instituições financeiras absorviam grande quantidade de profissionais da área de exatas pela excelência em sua formação e fácil adaptação desse pessoal no atendimento de operações de novos investimentos. Esses profissionais, no entanto, têm voltado para a indústria. "Conheço vários casos nos quais o profissional foi para a área financeira e voltou para a indústria dois ou três anos depois. Não vejo o mesmo movimento no sentido inverso", diz.
 
A empresa desenvolve uma estratégia para atrair esses profissionais para seus centros de pesquisa e mantê-los motivados. Começa com um pacto entre o líder e o liderado das atividades que serão desenvolvidas. "Fica muito claro qual a meta a ser atingida, que tipo de delegação ele possui para realizar a sua tarefa, quais as ferramentas e apoio disponível para isso e como será remunerado pela atividade", afirma.
 
Cursos de MBA podem auxiliar os pesquisadores a enfrentar os desafios de transformar a ciência em tecnologia e inovação na indústria, afirma Otávio Moraes, membro do conselho acadêmico da Cedepe Business School, rede de ensino superior do Recife, e diretor da Associação Brasileira das Instituições de Pós-Graduação. Esses programas ensinam a lidar com organização, planejamento, gestão da rotina e relacionamento com pessoas.
 
Por Salete Silva/ Valor Econômico