Alstom refaz estratégia no Brasil e reforça setor elétrico

Envolvimento do governo federal ajudará projetos do VLT deslanchar em várias cidades

 

Gigante na produção de trens no mundo, a francesa Alstom está com um "pé atrás" em relação ao setor ferroviário no país. Segundo o presidente da companhia no Brasil, Philippe Delleur, o setor tem apresentado instabilidade. Um exemplo é o projeto para o TAV (Trem de Alta Velocidade), que ligará Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro. Em três anos de negociações dos grupos interessados com o governo, o projeto acumulou um saldo de três licitações fracassadas. Delleur atribui as dificuldades de planejamento ao envolvimento de diferentes esferas de governo nos projetos e à pouca experiência brasileira com transporte sobre trilhos.
 
De acordo com o presidente, a Alstom tinha uma presença mais forte no fornecimento de trens no país, em especial trens urbanos, até meados dos anos 1990, mas a competição aumentou. "Nossa presença foi diluída em um mercado ainda pequeno. No mercado ferroviário, precisamos repensar nosso posicionamento estratégico no Brasil e é o que estamos fazendo", afirmou.
 
Um dos nichos que a Alstom tenta emplacar é o chamado VLT (Veículo Leve sobre Trilhos). O único contrato fechado até o momento, no entanto, está atrasado depois de contestações na Justiça do Distrito Federal quanto à escolha do consórcio construtor (a Alstom participa do consórcio fornecedor) e por problemas de licenciamento ambiental. O VLT de Brasília, cuja primeira fase de obras renderá R$ 355,8 milhões à Alstom, não vai mais ficar pronto para a Copa de 2014. De acordo com Delleur, os prejuízos para a Alstom foram reduzidos, mas ele lamenta a perda para a população da capital federal. " A gente estava com tudo pronto para o projeto e realmente dá pena".
 
Mesmo frente aos entraves burocráticos, a empresa acredita que o envolvimento do governo federal ajudará os projetos em outras cidades a deslanchar. Estão na mira da Alstom, por exemplo, os VLT"s de Cuiabá, Porto Alegre, Belo Horizonte e Salvador. Essa linha de investimento, porém, tanto dos VLT"s como do TAV, não garante estrategicamente produção local à empresa.
 
Delleur ressalta que para manter a atividade na fábrica brasileira da Alstom Transport, localizada no bairro da Lapa, na capital paulista, a aposta tem sido continuar a estabelecer contratos mais "tradicionais", como aqueles com o Metrô de São Paulo. Desde 2008, o grupo francês está fazendo a automatização das linhas 1, 2 e 3 do metrô paulista, em um contrato de R$ 737,1 milhões.
 
Se por um lado a empresa repensa o posicionamento no negócio de transportes, sua estratégia é de continuar pisando no acelerador do setor de energia. "A situação dos dois setores é bem diferente. A presidente Dilma, ainda quando ministra de Minas e Energia, realmente inventou um sistema de regulamentação do setor [de energia] supereficiente e o resultado é que isso deu um impulso para novos investimentos", avalia Delleur.
 
O "capex" [investimentos] da Alstom Brasil vem sendo puxado principalmente da área de energia. Subiu 214% de 2009 para 2010 e mais 45% em 2011, chegando ao mesmo patamar do montante aplicado na China (R$ 175,4 milhões). As novas unidades instaladas no Brasil nos últimos anos são voltadas à produção e desenvolvimento de equipamentos para usinas hidrelétricas e eólicas.
 
Em março, a Alstom lançou a pedra fundamental do centro de tecnologia na fábrica de Taubaté (SP), onde serão desenvolvidos projetos de engenharia de novas turbinas para hidrelétricas. O centro recebeu um investimento de R$ 15,3 milhões. Em novembro, foi aberta a fábrica de Camaçari (BA), que exigiu R$ 50 milhões, a qual atenderá as encomendas para usinas eólicas. Em 2010, a empresa inaugurou uma unidade em Porto Velho (RO), em parceria com a Bardella (cada uma investiu R$ 45 milhões), para produzir equipamentos mecânicos de grande porte. A fábrica, posicionada estrategicamente, fornece, entre outros produtos, comportas para empreendimentos hidrelétricos na Amazônia.
 
A Alstom é fornecedora de equipamentos em projetos como as usinas de Belo Monte (PA), Jirau e Santo Antônio (RO). Só nesses três projetos, os contratos são de R$ 1 bilhão, R$ 762,5 milhões e R$ 1,27 bilhão, respectivamente. A empresa também participa do fornecimento para o linhão [de transmissão da energia] do Madeira. Em usinas eólicas, os projetos são menos grandiosos, mas há contratos fechados para usinas na Bahia, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. De acordo com o executivo, as obras no setor elétrico responderam por cerca de 60% da receita da Alstom Brasil no último ano fiscal, encerrado em março, com R$ 2,6 bilhões.
 
São considerados prioritários, agora, diz Delleur, os leilões de transmissão de Belo Monte, que terá trechos de linhas leiloados a partir do fim deste ano, e a licitação das usinas hidrelétricas do rio Tapajós. Essa segunda linha de empreendimento é de especial interesse para a Alstom por serem usinas com grande desenvolvimento tecnológico. Chamadas de usinas-plataforma, as instalações do Tapajós serão construídas sem acesso por rodovias, tendo menor impacto ambiental à obra.
 
 
Por Ana Fernandes/Valor Econômico

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