Parceria entre Unicamp e Tecnometal busca inovação em energia solar

A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a empresa Tecnometal estão promovendo uma parceria em pesquisa e desenvolvimento do processo de purificação do silício metalúrgico para transformá-lo em células de energia solar fotovoltaicas. A empresa mineira, que conta com uma fábrica de painéis fotovoltaicos (FV) em Campinas (SP) — a única companhia que fabrica esse produto no Brasil — quer verticalizar sua produção e para isso está apostando na pesquisa em colaboração com a universidade.
 
Um primeiro projeto já foi enviado para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no âmbito do Fundo Tecnológico (BNDES Funtec), no valor de R$ 12,860 milhões, e foi pré-selecionado pela instituição em janeiro. Esse projeto, com previsão de duração de três anos, prevê a construção de um laboratório de 500 metros quadrados na universidade e a compra de diversos equipamentos de pesquisa. Dentro do valor total, a Tecnometal Energia Solar deverá oferecer uma contrapartida de 10% do projeto.

Estão envolvidos na pesquisa o Laboratório de Fusão por Feixe de Elétrons e Tratamentos Termomecânicos, do Departamento de Engenharia de Materiais da Faculdade de Engenharia Mecânica, e o Laboratório de Pesquisas Fotovoltaicas, do Instituto de Física Gleb Wataghin, sob a coordenação dos professores Paulo Roberto Mei e Francisco das Chagas Marques, respectivamente. O projeto está dividido em três etapas: o desenvolvimento do processo de purificação do silício grau metalúrgico (Si-GM), a fabricação de lâminas de silício grau solar (Si-GS) e a fabricação de células solares. Na universidade, as primeiras duas etapas estarão, majoritariamente, sob a responsabilidade da Faculdade de Engenharia Mecânica, enquanto a terceira fase será incumbência do Instituto de Física. Independentemente da aprovação final do BNDES, a Unicamp e a Tecnometal pretendem dar prosseguimento à parceria com o desenvolvimento de projetos a partir de outras fontes de financiamento.
 
"Uma das inovações desse projeto da Unicamp com a Tecnometal é que nós iremos trabalhar em conjunto sob uma condição praticamente única no mundo ao mexer com o silício e a célula imediatamente, provendo uma realimentação de conhecimento entre a empresa e a universidade, com a finalidade de fazermos uma célula nacional, com silício nacional, que possa ser utilizada nesse imenso mercado que teremos", afirmou Bruno Topel, responsável pela área de Tecnologia e Projetos Especiais da Tecnometal Energia Solar, durante o 2º Workshop Inovação para o Estabelecimento do Setor de Energia Solar Fotovoltaica no Brasil (Inova FV), realizado na Unicamp nos dias 13 e 14 de março.
 
Única empresa a produzir no Brasil
A planta da empresa no interior de São Paulo iniciou a produção de painéis FV em 2011, a partir de células importadas, e conta com uma capacidade instalada de produção anual de 25 MWp, com um índice de nacionalização acima de 60%. Fundada em 1990 em Vespasiano (MG), a Tecnometal produz também equipamentos de grande porte para mineradoras e siderúrgicas. "A Tecnometal Energia Solar está em um processo de reengenharia e pretende ter um processo verticalizado, desde o crescimento do silício, e quem sabe até a etapa de metalurgia, em um prazo de tempo extremamente curto. Isso já está em andamento; tanto é assim que nosso projeto com o professor Mei, que já foi acolhido pelo BNDES, tem etapas sendo adiantadas", explicou Topel. Segundo Mei, quando a Tecnometal começou a produzir as placas FV, a empresa já procurou a Unicamp para desenvolver uma parceria.

Topel foi um dos fundadores da Heliodinâmica, empresa paulista que chegou a deter 6% da produção fotovoltaica mundial em meados da década de 1980, mas que encerrou sua produção em razão da concorrência externa. Durante palestra no 2º Inova FV, Topel considerou a recente chamada da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para pesquisa e desenvolvimento em energia solar como um "marco inesquecível na história fotovoltaica brasileira". Publicada em agosto de 2011, a chamada nº 13, intitulada "Arranjos Técnicos e Comerciais para Inserção da Geração Solar Fotovoltaica na Matriz Energética Brasileira", teve 18 projetos qualificados, somando 24,5 MWp e R$ 400 milhões.
 
Segundo Topel, cinco desses projetos têm a participação da Tecnometal como fornecedora dos sistemas completos. O projeto estratégico, de acordo com a Aneel, compreende pesquisa e desenvolvimento para a geração de novo conhecimento tecnológico, exigindo um esforço coordenado de várias empresas de energia elétrica e entidades executoras. Entre os pré-requisitos do projeto estão a instalação de uma usina solar fotovoltaica conectada direta ou indiretamente por meio de unidades consumidoras à rede de distribuição ou transmissão de energia.
 
Potencial brasileiro
O Brasil conta com uma das maiores reservas de quartzo do mundo, a principal matéria-prima para a fabricação do silício. Atualmente, seis empresas — quatro delas de capital nacional — produzem no País o Si-GM — material com um grau de pureza de 98,0% a 99,9%. Países como os Estados Unidos importam grandes quantidades de Si-GM, de baixo valor agregado, para exportar silício de grau eletrônico (Si-GE), usado na indústria microeletrônica, com valores até cem vezes maiores. O principal sistema de purificação para fabricação de Si-GE, o chamado Processo Siemens, foi desenvolvido na Alemanha na década de 1950 e atualmente é plenamente utilizado na indústria.
 
Pesquisas em várias partes do mundo buscam novos métodos para reduzir os custos e obter o silício para células solares diretamente do Si-GM, sem a necessidade de se passar pelo processo alemão. Para se fazer células solares, não é preciso um silício com um grau de pureza tão elevado quanto o utilizado na microeletrônica. Além desse tradicional sistema de produção do Si-GE, foi feita uma modificação no Processo Siemens para gerar um Si-GS de uma forma mais barata e rápida, produzindo um material de menor pureza, mas eficiente para a produção de células solares.
 
Rotas alternativas
A busca por processos alternativos para a produção do Si-GS — como por lixiviação, desgaseificação e solidificação controlada — vem sendo tentada desde a década de 1980, mas como a demanda era pequena, não houve interesse na época em se investir nessas pesquisas. "Como a maioria do silício hoje está sendo destinada para o setor fotovoltaico, e ele não requer uma pureza tão grande, as pesquisas estão tentando utilizar o silício grau metalúrgico e tentar desenvolver algum processo que permita utilizá-lo para a produção de células; é o que nós chamamos de silício grau metalúrgico melhorado [Si-GMM]", definiu Mei em entrevista a Inovação Unicamp. De acordo com ele, os requisitos para o emprego desse tipo de silício na fabricação de células são, basicamente, um grau de pureza entre 99% a 99,999% e um nível de eficiência energética de ao menos 10% — que é o percentual de radiação solar aproveitado pelo equipamento.
 
"As pesquisas estão buscando baratear o custo do silício porque ele representa 25% do preço do módulo fotovoltaico. Então, se baixarmos o preço do silício, baixaremos o preço do módulo. Como o Processo Siemens está mais ou menos estável no mercado, os pesquisadores estão tentando fazer um processo que gere um silício mais barato, como nós estamos tentando", contou Mei. De acordo com o professor da Unicamp, seu grupo de pesquisa já conseguiu produzir neste ano um Si-GMM com até 13% de eficiência energética, o que comprova a viabilidade técnica do processo. "Nós percebemos que, para melhorar a eficiência, não adianta apenas purificar o silício, pois a eficiência da célula vai depender da pureza do silício, da estrutura cristalina dele, que nós chamamos de qualidade estrutural, e do processamento da célula, que tem que ser um processamento novo, diferente daquele utilizado com silício gerado pelo processo Siemens", destacou Mei.
 
A ideia de Mei é testar vários processos associados, como o de fusão de silício no forno de feixe de elétrons, que já se mostrou bem-sucedido nas pesquisas, além de outras técnicas. A estratégia será estudar as contribuições de cada uma dessas técnicas ao processo de purificação do silício, para posteriormente identificar as mais eficientes e com menor custo, e associá-las em uma nova rota de produção.


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