Ebulição nos negócios agita engenharia local

Consultas feitas por Automotive Business entre os participantes do simpósio Testes e Simulações na Indústria Automobilística, promovido pela SAE Brasil na segunda-feira, 12, em São Paulo, indicaram visões contraditórias sobre as transformações na indústria automobilística no campo da engenharia. Em momento de ebulição nos negócios, gerentes de projetos em montadoras ou autopeças e prestadores de serviços reagem de forma diferente a questões como o apagão de pessoal qualificado ou a chegada de novos atores ao mercado brasileiro.

O salário médio nas equipes de engenharia no Brasil está no patamar de R$ 5 mil. A escalada para postos de chefia ou tarefas que exigem especialização elevam a remuneração, mas a evolução costuma ser lenta se não houver convite para saltar degraus. Na prática, a escassez no mercado tem levado jovens recém-formados a alcançar salários superiores ao de funcionários mais antigos, causando alguns constrangimentos.

Trabalhadores engajados entre os fabricantes entendem que há uma carga expressiva de tarefas, mas também oportunidade para qualificação e conquista de novas experiências em projetos globais. Alberto Rejman, diretor executivo de engenharia da General Motors, disse a Automotive Business que a exportação de serviços tem ganhado importância crescente para a operação local. Nos últimos quatro anos o número de profissionais na área passou de 650 para 1.250, hoje empenhados em atender projetos internacionais, para emergentes e países desenvolvidos.

Organizador do simpósio Testes e Simulações e chairman da seção São Paulo da SAE Brasil, Rejman afirmou que é preciso valorizar cada vez mais as simulações na área de projetos automotivos, para ganhar velocidade nos empreendimentos e reduzir custos. Os testes físicos, cada vez mais escassos, representam o contraponto das simulações, permitindo checar o que foi decidido no mundo virtual.

Negócios em testes e simulações
Já os prestadores de serviços queixaram-se dos patamares de remuneração e da concorrência dos escritórios de montadoras em outras partes do mundo, que absorvem tarefas facilmente executáveis no Brasil. Ficou claro também que diretores de empresas de consultoria na área de testes e simulações têm sido procurados por empresas estrangeiras do segmento que pretendem se estabelecer no País.

Embora as negociações para parcerias sejam mantidas em sigilo, sabe-se que a britânica Mira e a espanhola Ctag (Centro Tecnológico de Automoción de Galícia) estão desembarcando no Brasil. A última passou a ser representada pela Try Testes e Simulações. "Temos interesses comuns", admitiu Fábio Braga, diretor da empresa brasileira, que também é um braço da CarSim e mantém acordos com a Pieracciani, o IQA e a Virtual CAE.

Flávio Campos, diretor de engenharia da Delphi, acredita que as áreas de engenharia e tecnologia no País podem ser engolidas por estrangeiros se não houver uma decisão firme de estimular a inovação. Para ele, os custos de serviços locais são elevados em relação a países como México, Índia, Coreia e China. A Coreia, em especial, está na dianteira em desenvolvimento e tem apostado em educação e tecnologia para ganhar competitividade.

Sadao Hayashi, diretor da NHT Engenharia, especialista em ensaios automotivos, concorda com Campos, mas ressalva que os newcomers não chegam com engenharia completa. "Como regra geral, pouco conhecem da legislação local e encontram obstáculos na hora de homologar seus produtos", explica. Ele esclarece que o motor dos veículos importados, por exemplo, precisa ser calibrado dentro dos padrões de emissões e níveis de ruídos exigidos no Brasil.

O executivo assinala que sua equipe oferece serviços de avaliação de veículos e sistemas, medições experimentais e conhecimento de produtos. "Hoje as próprias montadoras têm dificuldade em encontrar profissionais capazes de enxergar o veículo como um todo. Os projetistas trabalham em partes estanques, com uma visão detalhista". Hayashi afirma que já foi procurado por empresas estrangeiras interessadas em fazer joint ventures e ainda avalia propostas. O mesmo aconteceu com José Ricardo Nogueira, diretor e proprietário do Grupo Smarttech, que resistiu até agora a investidas do gênero e preferiu investir no crescimento dos negócios com o desenvolvimento do laboratório de testes e simulações em Holambra, na região de Campinas (SP).

Demanda de serviços elevada
"A demanda por serviços de engenharia é elevada. O mercado é comprador, embora muitas vezes as tarefas sejam voltadas para a solução de problemas não previstos", explicou Nogueira. Ele entende que há poucos profissionais disponíveis na praça para atender exigências de alto nível na área de testes e simulações: "São necessários dois a três anos para uma formação adequada. No início, o jovem profissional é praticamente um operador de software, sem conhecer as aplicações".

A Smarttech possui cinco dezenas de profissionais, a maioria concentrada no site em Holambra. No local a empresa investiu cerca de R$ 1,5 milhão para a construção das instalações. "As simulações abreviam o tempo de desenvolvimento e apontam as melhores soluções, mas é indispensável confrontar os resultados com as provas de campo", garante Nogueira, que avalia também um aporte para a construção de pistas de testes.

"As empresas locais não têm muitas alternativas para promover seus testes, que acabam sendo realizados em ruas e estradas, onde não há um nível de controle adequado. Nem mesmo se pode assegurar a repetição das provas em condições idênticas", justifica.

Álvaro Costa Neto, sócio-diretor da Multicorpos Engenharia, que tem escritórios em São Paulo e São Carlos, no interior paulista, optou pela diversificação na prestação de serviços depois de apostas contínuas no setor automotivo e dificuldade para preservar equipes qualificadas. "Resolvemos atacar o setor ferroviário e também a área de petróleo e gás", observou. Ele decidiu, ainda, oferecer pacotes completos aos clientes, que passam pela comercialização de softwares, treinamento, operacionalização de aplicações e projeto piloto. Entre outros softwares, disponibiliza o Adams, da MSC, para análises por elementos finitos.