Diferença no padrão de consumo dos Bric desafia montadoras

Imagem: Divulgação

Até 2014, a participação dos países do Bric nas vendas de veículos vai triplicar. Já faz tempo que a indústria percebe esse potencial. No entanto, montadoras e fornecedores de autopeças têm ainda muito para organizar dentro do grupo composto por Brasil, Rússia, Índia e China, segundo revela estudo da consultoria The Boston Consulting Group. Poucas empresas têm estruturas industriais fortes em todos os países do bloco. Outro grande desafio será lidar com as diferenças de preferência dos consumidores, o que impede a criação de um carro Bric.

A soma das vendas no Brasil, Rússia, Índia e China aumentou de 15 milhões para 19 milhões entre 2007 e 2009, período em que o mercado mundial encolheu de 70 milhões para 62 milhões de unidades. Para 2014, quando o mercado global poderá crescer para algo entre 78 milhões e 87 milhões de veículos, a parte dos Bric já estará em 23 milhões a 27 milhões, dependendo da conjuntura. Isso indica que a fatia do bloco saltará de pouco mais de 10% para quase 30%.

Com base em entrevistas com 250 líderes de empresas do setor, nos quatro países, o estudo mostra que os dirigentes da indústria automotiva estão ainda reticentes e céticos em relação aos históricos altos e baixos das economias emergentes. Talvez, por isso, ações como o desenvolvimento de produto, estejam ainda focadas nos mercado tradicionais.

"Os Bric serão o motor do crescimento da indústria automobilística, liderada por China, seguida pelo Brasil, no domínio dessa tendência", afirma Nikolaus Lang, sócio do BCG em Munique e coautor do estudo. Para ele, que analisa o setor automotivo com ênfase nas regiões emergentes há 15 anos, falta à maior parte das empresas homogeneizar presença em todo o bloco. "Apenas quatro têm uma presença realmente forte nos quatro países: Volkswagen, General Motors, Bosch e Delphi.

Isso significa que 92% das empresas do setor que atuam nos Bric não cobrem o bloco totalmente. "Há, por exemplo, empresas como Fiat, que é uma 'super star' no Brasil, mas não está muito presente na Índia ou China", afirma Lang. Segundo o estudo, 45% das empresas entrevistadas são do tipo "campeãs em um só país dos Bric".

A Hyundai, uma campeã na Índia, só agora começa a investir no Brasil. Os exemplos excluem, obviamente, as marcas de alto luxo, que dispensam produção em escala em todos os países. "Quem compra um modelo BMW é como aquele que não gostaria que a sua bolsa Louis Vutton fosse produzida fora da França", diz Lang.

Mas um dos maiores desafios que os tradicionais fabricantes de veículos não haviam ainda se deparado antes de o crescimento da demanda se concentrar nesse bloco de emergentes é perceber que não existe um carro Bric. Não há um modelo de veículo uniforme, que possa ser vendido ao mesmo tempo para brasileiros, indianos, chineses e russos.

"As diferenças de gostos no Bric são bem maiores do que nos mercados maduros", afirma o consultor. "É muito mais fácil vender um carro europeu para um japonês ou mesmo para um americano, do que vender um veículo brasileiro para um indiano", completa.

O chamado carro popular vendido no Brasil - modelo pequeno, estilo hatch, com motor 1.0 - é bem diferente do subcompacto Nano, com o qual a indiana Tata conquista seu mercado de origem. Já na China, a preferência é pelos modelos sedãs, com toque de luxo e conforto, principalmente no banco traseiro. Um sedã mais rústico do tipo Lada vai bem na Rússia. Mas não teria boa aceitação entre brasileiros, que, para aflição das equipes de engenharia, são os mais exigentes na relação entre bom, bonito e barato.

O estudo do BCG mostra que Brasil e China são, de longe, os países do bloco com maior índice de nacionalização de componentes. "Mesmo assim, ainda há muito pela frente", diz Lang. Segundo ele, a Índia está 10 anos atrás de China e Brasil e a Rússia, 20 anos atrasada em relação a China e Brasil.

Mesmo tendo ido para o fundo do poço, com uma queda de vendas de 48% em 2009, a Rússia permanece no bloco porque, segundo Lang, ainda apresenta potencial de crescimento. Segundo o estudo, esse país levará ainda quatro anos para voltar a ter o tamanho que tinha há dois anos. Mesmo assim, lembra o consultor, deverá se destacar como o maior mercado da Europa, ultrapassando a Alemanha.

Brasil e Índia são os mais fortes hoje em desenvolvimento de produto e pesquisa. O Brasil se destaca nos projetos de motores pequenos, incluindo a tecnologia flex. Mas a China ganha de todos em abastecimento de peças, que vai de pneus aos eletrônicos.

Na área de manufatura, China e India deverão receber os maiores volumes de investimentos daqui em diante em razão do potencial de crescimento. "Uma preocupação dos executivos que comandam as filiais brasileiras é saber se, diante dos recursos que hoje vão para a China, sobrará dinheiro para as fábricas do Brasil", destaca Lang.


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