Como a remanufatura pode salvar o futuro industrial?

Nova abordagem pode reduzir emissões em até 80% e gerar milhares de empregos qualificados

A busca pelo zero líquido e pela sustentabilidade econômica exige muito mais do que a transição para energias renováveis. Como alerta Stephen Fitzpatrick, diretor do Digital Factory and ReMake Value Retention Center do National Manufacturing Institute Scotland (NMIS), a maneira como fabricamos e mantemos a infraestrutura de energia e transporte é hoje parte do problema – e a remanufatura pode ser a solução estratégica que o mundo ainda subestima.

As estimativas são alarmantes: para alimentar setores como energia, engenharia de precisão e transporte na próxima década, 500 milhões de toneladas de matérias-primas serão extraídas, resultando em quase uma gigatonelada de emissões de carbono. Pior: 70% dessas emissões ocorrem ainda na etapa de extração e processamento de matérias-primas. Frente a este cenário, prolongar a vida útil dos produtos e maximizar seu valor emergem como estratégias indispensáveis.

No entanto, a economia global caminha na direção contrária. Hoje, a circularidade caiu para apenas 7%, e a remanufatura representa menos de 2% dos fluxos globais de materiais. Um desperdício de oportunidade: enquanto a reciclagem pode degradar a qualidade dos materiais e a reutilização apenas prolonga seu uso, a remanufatura garante componentes de alta integridade — que podem superar as especificações originais. Incorporar princípios de reparabilidade, reforma e desmontagem desde o design pode reduzir emissões em até 80%, reforçar cadeias de suprimentos e impulsionar a inovação industrial.

Necessidade estratégica 

Além do impacto ambiental, a remanufatura se impõe como pilar econômico e de resiliência. Em um mundo onde matérias-primas críticas estão se tornando escassas e cadeias de abastecimento são cada vez mais vulneráveis, reter e recuperar valor de produtos existentes deixou de ser uma opção — virou uma necessidade estratégica.


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Um ecossistema robusto de manufatura circular pode gerar milhares de empregos qualificados, impulsionar a regeneração econômica regional e abrir novos modelos de receita, como servitização e leasing.

No centro desta transformação, o NMIS lidera com iniciativas como o Centro de Retenção de Valor ReMake. O projeto de £10 milhões, em parceria com as Universidades de Strathclyde, Exeter e Sheffield, investe na inovação circular para setores de alta integridade, conectando tecnologia, política, habilidades e novos modelos de negócios.

Um exemplo dessa revolução é o desenvolvimento de passaportes digitais de produtos (DPPs), que oferecem transparência total sobre a pegada ambiental de produtos e desbloqueiam novas fontes de valor por meio dos dados do ciclo de vida.

A mensagem é clara: para alcançar o zero líquido e construir uma economia mais resiliente, a indústria precisa parar de pensar de forma linear. A remanufatura, aliada à inteligência de dados e a uma mudança sistêmica, pode ser o motor dessa nova era — mais sustentável, mais inteligente e mais forte.

*Imagem de capa: Depositphotos.com