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Podemos ter uma extração mineral com resultado, segurança e sustentabilidade?

A mineração apresentou um resultado significativo em 2021: 80% do saldo comercial brasileiro veio dessa indústria extrativista. Mas quais são os impactos dela além do financeiro?

Responsável por aproximadamente 3% do PIB brasileiro, em 2021, a indústria extrativista de produção mineral exportou quase US$49 bilhões, um crescimento de 51% em comparação a 2020. A produção passou de 1,073 bilhão de toneladas para 1,150 bilhão. Esse aumento foi importante para o saldo da balança comercial do Brasil fechar de maneira positiva no ano. Além disso, de acordo com o Governo Federal, o setor gerou 200 mil empregos diretos em 2021. 

De acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), o estado que apresentou maior crescimento em faturamento no ano passado foi Minas Gerais. Passando de R$76,4 bilhões em 2020 para R$143 bilhões, um aumento de 87%. Com isso, Minas é responsável por 42% do faturamento da indústria da mineração brasileira em 2021, depois vem Bahia com 67% de aumento de faturamento, Pará com 51%, Goiás com 36%, Mato Grosso com 35% e São Paulo com 28%.

Crescimento x impacto ambiental 

Com a ampliação da extração e dos resultados, crescem também os impactos negativos e os acidentes ambientais. No último relatório do Ibama, lançado em fevereiro deste ano, em 2020 foram registrados 20 acidentes em barragens e cinco no processo de mineração. 

“Inicialmente, devemos considerar que a maioria dos empreendimentos tem funcionado de forma responsável. Por outro lado, descuidos com avaliações de risco e com passivos ambientais e na desativação de empreendimentos têm gerado impactos ambientais intoleráveis e de longo prazo. São exemplos algumas situações de rejeito da exploração de metais abandonados, irresponsabilidade na análise de segurança de instalações, como barragens e galerias de exploração, que colapsam e provocam acidentes e desastres”, explica Renato Lima, professor do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Paraná, especialista em impactos ambientais da mineração e diretor do Centro de Apoio Científico em Desastres (CENACID).


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Ele reforça que é necessário destacar as importantes consequências danosas de atividades informais de busca de bens minerais e do descontrole dessas ações pelos organismos de governo. “Áreas extensas, de regiões frágeis e relevantes, têm sido impactadas com efeitos significativos no médio e longo prazos por falta de uma política eficaz de controle, de orientação e de repressão a este tipo de atuação. Neste sentido, uma ação urgente é a garantia de segurança aos agentes públicos encarregados da proteção da sociedade através da fiscalização”, completa.

Para ele, é possível ter uma indústria de mineração com impactos ambientais reduzidos e segura, basta partir do princípio de que tudo o que fazemos resulta em impacto e risco, e que o objetivo é sempre trabalhar com segurança e foco em preservar o meio ambiente. 

“Para alcançar um elevado nível segurança, claramente o fator primordial é a prioridade à segurança. Se for a produtividade ou as finanças, necessariamente deixaremos a segurança para um nível secundário, resultando até mesmo em desastres. O mesmo vale para o impacto ambiental. Ele deve ser tratado como um dos pontos escolhidos pela empresa como chave para seu sucesso. Observo ainda que as ações ambientais e de segurança estão relacionadas. Descuido com o meio ambiente amplifica ou gera insegurança em diferentes frentes, e descuido com a segurança dos colaboradores ou da comunidade envolvida gera problemas e danos ambientais. Em algumas situações, descuidos nestes temas têm resultado em desastres de grandes proporções”.

A importância para a indústria metalmecânica

Apesar de todos os contras, a extração mineral brasileira é importante para o avanço industrial e tecnológico em todo o mundo. Nosso país tem a maior reserva de nióbio do mundo, por exemplo. O metal é responsável pela resistência mecânica do aço nos tubos de gasodutos e muito utilizado em motores de aeroplanos, ligas supercondutoras para as indústrias nuclear, eletrônica, entre muitas outras. Além disso, somos a terceira maior reserva de grafita, um mineral muito utilizado em baterias e que, com a tendência dos carros elétricos, apresenta um potencial ainda maior de utilização num futuro próximo. 

Como a tecnologia pode ajudar?

A tecnologia pode ser uma grande aliada na prevenção de acidentes ambientais. Para o diretor de Sustentabilidade e Assuntos Regulatórios do Ibram, Julio Cesar Nery Ferreira, a mineração vive da pesquisa aplicada. “As melhores práticas em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) são intrínsecas ao processo produtivo do segmento. Seja buscando eficiência operacional, seja desenvolvendo novos produtos, seja buscando otimizar o uso de recursos naturais como água ou energia, a mineração é uma indústria que respira inovação desde a fase de pesquisa/exploração mineral até a fase de fechamento de mina. Além de possuir centros de tecnologia próprios, o setor conjuga boas práticas como hubs de inovação e instituições de fomento à pesquisa. Podemos citar o Mining Hub em Belo Horizonte, dos espaços do SENAI e das escolas de formação de técnicos, dos centros Embrapii e parcerias com universidades e outras instituições de pesquisa em diversas localizações no território brasileiro”, explica. 

Renato reforça com a opinião de que as indústrias que desenvolverem os equipamentos e tecnologias mais seguros e que resultem em menor impacto ambiental, serão as que terão o domínio do mercado no futuro. “A utilização de controles cada vez mais elevados será uma exigência de padrões de qualidade de vida que a sociedade vai determinar, e ainda impostos por meio de leis e de fiscalizações dos agentes do poder executivo”.  

Mineração e ESG

O especialista da UFPR explica que, quando se fala de ESG, cada empresa escolhe seu caminho e suas práticas para avançar nos eixos ambientais, sociais e de governança conforme a sua área de atuação, os riscos envolvidos na atividade, suas prioridades e experiências, e sua visão de futuro. “Atualmente, ao mesmo tempo que diversas iniciativas avançam efetivamente nestas ações positivas, observo que muitas empresas ainda não atuam com esta visão, algumas fazem ações de ‘maquiagem’ nestes temas e outras nem mesmo adotam efetivamente estes eixos”.

A dica de Renato para que as práticas de ESG avancem é a integração das frentes em uma abordagem interdisciplinar. “Se estes temas são tratados de forma isolada, não alcançarão os resultados esperados. O descolamento destas linhas de ação gera riscos sociais e ambientais, e pode ameaçar a sobrevivência dos gestores na função e da própria iniciativa, como vimos em algumas situações no passado. Uma prática que considero recomendável é imaginar as futuras restrições e exigências ambientais e de segurança, e antecipar e adotar agora padrões que ainda não são exigidos. Da mesma forma uma governança em sintonia com a comunidade, deveria antecipar suas questões e preocupações, em uma política efetiva de cooperação e de escutar a comunidade envolvida, inclusive aquela parte que tem posicionamentos contrários à iniciativa”.

O Ibram reforça a importância ao estímulo das práticas de ESG nas empresas associadas. Desde 2019,12 frentes são desenvolvidas em grupos de trabalho:Segurança Operacional; Barragens e Estruturas de Disposição de Rejeitos; Saúde e Segurança Ocupacional; Mitigação de Impactos Ambientais; Diversidade e Inclusão; Relacionamento com Comunidades; Desenvolvimento Local e Futuro dos Territórios; Comunicação e Reputação; Inovação; Água Energia; Gestão de Resíduos.

“No de Saúde e Segurança, por exemplo, mais de 20 associadas compartilham boas práticas em segurança operacional. A força do exemplo e das boas práticas tem um poder de multiplicação imenso no setor, e nisso as mineradoras estão empenhadas em dividir seus casos. Podemos sinalizar que todas associadas dos grupos de trabalho estão fortemente empenhadas em reduzir acidentes e mitigar impactos ambientais. A meta do setor é acidente zero”, finaliza Julio.

Imagem de capa: Depositphotos