Venda de sucata ferrosa chega a 300 mil toneladas por mês

Estudo do Grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da FGV apresenta informações inéditas sobre o setor no Brasil.

As empresas de comércio de sucata ferrosa no Brasil, uma das principais matérias-primas usadas na produção de aço, vendem mensalmente cerca de 300 mil toneladas do produto, adquirido junto às indústrias, ferros-velhos e cooperativas de catadores. Esse volume é negociado quase totalmente no mercado interno. Cerca de 57% das empresas comercializam apenas no mercado nacional e 43% delas tanto internamente como no exterior. Os dados fazem parte do estudo inédito “Painel de Indicadores Setoriais para o Comércio Atacadista de Sucata Ferrosa”, elaborado pelo Grupo de Economia da Infraestrutura e Soluções Ambientais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a pedido do Instituto Nacional das Empresas de Sucata Ferro e Aço (Inesfa). 

O estudo, feito a partir de pesquisa com as empresas associados ao Inesfa, foi divulgado no último dia 30, durante seminário realizado na Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, para uma plateia de cerca de 100 pessoas, composta por representantes do setor, especialistas e empresas fornecedoras de equipamentos.

Segundo o economista Gesner Oliveira, ex-presidente do Conselho Administrativo e Defesa Econômica (Cade), professor da FGV e um dos autores do levantamento, ainda existe “muito desconhecimento sobre a importância do segmento de sucata para a economia do país”. O setor, afirma, garante renda a 1,5 milhão de pessoas, desde a coleta, seleção, preparação, até a distribuição de materiais metálicos. Desse grupo, de 600 mil a 800 mil são catadores, independentes ou reunidos em cooperativas e associações. Pouco mais de 5.000 empresas realizam o comércio da matéria-prima.

Apenas os associados do Inesfa são responsáveis por 47% de toda a sucata preparada no País. Desse total, perto de 10% das empresas analisadas respondem por cerca de 65% do total das receitas do setor. Em valores brutos, essa receita é de R$ 1,34 bilhão por ano. A maior parte das empresas associadas ao Inesfa está concentrada no Centro-Sul do país, principalmente em São Paulo. O estudo será atualizado regularmente e permitirá a divulgação periódica de um painel de indicadores do setor. 


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De acordo com o levantamento, as empresas negociam diretamente no mercado doméstico 76,9% da sucata com as usinas siderúrgicas, 3,8% com outras empresas de comércio de sucata e 19,3% tanto diretamente com as usinas como com outras empresas. A pesquisa aponta insatisfação das empresas com o preços: 52% das associadas afirmaram não estar satisfeitas, já que os valores em geral são inferiores àqueles pagos pelo mercado internacional.
 
Um dado que chama a atenção no estudo é a consolidação do setor nos últimos anos. “Há um processo de concentração do setor, com empresas de maior porte adquirindo empresas menores”, diz Gesner Oliveira. Esse processo deve obrigar a uma mudança no grau de relacionamento das empresas com os seus fornecedores. E também, conforme o economista, é
das uma das razões da maior entrada das empresas no mercado internacional. “A consolidação permite mais escala e maior capacidade de investimento”, diz.
 
“O mercado internacional é de extrema importância principalmente por amenizar os efeitos de sazonalidade na venda de sucata ferrosa a que o mercado nacional está sujeito”, destaca Oliveira. “Tal sazonalidade permite que os valores no mercado internacional fiquem mais elevados, podendo ser superiores aos valores nacionais em até R$ 100 por tonelada.”

Potencial de exportação da sucata

Atualmente, a participação da sucata na produção de aço bruto no Brasil oscila entre 26% e 28%, bem abaixo da média mundial, de cerca de 45%. No exterior a sucata é  tratada como commodity, com cotação internacional, e é negociada com valores de 30% a 40% mais altos do que no Brasil. Conforme o Inesfa, o país exporta atualmente apenas 3,5% do volume da sucata consumida no mercado interno. As exportações de sucata do Brasil representam menos de 0,01% do total mundial. O Brasil é considerado um país pequeno no comércio mundial de sucata, já que sua demanda e oferta não são capazes de influenciar o preço internacional da sucata.

Os principais países exportadores de sucata são, respectivamente, Estados Unidos (22,1%), Alemanha (8,9%), Holanda (5,2%), Reino Unido (7,0%) e Japão (4,9%). Juntos, os cinco países respondem por quase 50% das exportações mundiais de sucata. Os principais compradores de sucata brasileira são os países asiáticos, entre os quais Índia, China e Indonésia.  Já as maiores empresas importadoras são Indicaa e Everest (Emirados Árabes), Tata Steel (Índia) e Global (Espanha). 

Políticas públicas

Ainda de acordo com Gesner Oliveira, a divulgação do estudo visa a uma conscientização mais ampla da sociedade sobre a importância do setor de sucata, bem como compartilhar conhecimento para a formulação de novas medidas de política pública ou o aprimoramento das atuais. Dentre os incentivos governamentais disponíveis hoje estão os leilões de veículos antigos, uma fonte importante de sucata ferrosa para o setor. Segundo o estudo, 52% das empresas ouvidas na pesquisa acreditam que os leilões de veículos fortalecem o setor, garantem o abastecimento, além de proporcionarem benefícios à sociedade, de forma geral. No entanto, as empresas esperam progressos tanto na maneira como os leilões são realizados como na oferta de melhores condições comerciais e organização.

Ganhos no setor ambiental

O uso da sucata apresenta inequívocas vantagens ambientais em pelo menos cinco dimensões. Em primeiro lugar, sua utilização nos fornos da siderurgia acarreta menor consumo de energia e combustível. Em segundo, gera menores emissões de gás carbônico, óxidos de enxofre e nitrogênio, monóxido de carbono e material particulado. Em terceiro, diminui a geração de resíduos, como escória e refratário, devido ao menor desgaste de refratário. Em quarto, a reciclagem de sucata ferrosa gera economia do espaço em aterros, o que aumenta sua vida útil, em linha com a Política Nacional de Resíduos Sólidos.  “Quando se fala no uso da sucata, estamos falando do futuro, de um processo de produção mais sustentável e racional”, afirma Oliveira.

O estudo mostra que as empresas de reciclagem de sucata ferrosa contribuem também para o reaproveitamento de outros materiais, metálicos e não metálicos, que vêm misturados ao ferro e ao aço na sucata. Neste caso, ocorre maior aproveitamento do conteúdo de energia, água e matérias-primas necessárias à fabricação do bem do que se convertê-lo novamente em aço, atendendo ao princípio dos 3Rs (redução, reutilização e reciclagem).

Para Gesner Oliveira, o setor vem se modernizando, principalmente em termos de gestão e processos, o que enseja a oportunidade de  ingresso na vanguarda da chamada economia verde. “As empresas devem considerar diversas oportunidades para crescerem, como o advento do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, o maior nível de conscientização ambiental da população e a pressão para redução das emissões de gases de efeito estufa”, afirma.


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