Mineração e metalurgia poluem Rio Ribeira de Iguape

Fonte: Agência USP 20/06/07

O Rio Ribeira de Iguape, que nasce no Paraná e desemboca no litoral sul de São Paulo, sofre até hoje com os efeitos das atividades poluidoras praticadas por empresas de beneficiamento e fundição de minérios de chumbo e prata instaladas no alto Vale do Ribeira. Diferentes tipos de sedimentos apresentam teores elevados de metais pesados, como chumbo e zinco, que são tóxicos - este último, quando em concentrações elevadas. Eles provêm não apenas do resíduo da mineração, lançado por aproximadamente 40 anos no rio, mas também dos resíduos da metalurgia, o que nunca havia sido levado em conta. “Em todas as investigações já realizadas, nenhuma analisou a escória (resíduo da metalurgia) por achar que ele era inerte”, conta a geóloga Valéria Guimarães.

Em seu doutorado, realizado no Instituto de Geociências (IGc) da USP, a pesquisadora não só verificou a contribuição desses resíduos na contaminação do rio como comprovou que eles estão interagindo com o ambiente por meio da análise de moluscos nele coletados. “Estudos mostraram a existência de metais pesados provenientes destes resíduos em teores acima do permitido para consumo segundo valores de referências definidos pela ANVISA [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]”, alerta Valéria. “Cabe ressaltar que estes moluscos são consumidos pela população da região.”

As maiores concentrações de metais pesados estão na região de Iporanga, local de coleta mais próximo de onde ocorriam as atividades de exploração de minério


Poluentes

Na mineração, as rochas que contém o minério passam por um processo de cominuição (forma de moagem de rocha), no qual se separa as partes que têm ou não valor econômico. A que não possui valor é chamada de resíduo da mineração, a qual ainda contém metais  potencialmente tóxicos – no caso do estudo, continha chumbo, zinco e cobre. Já na metalurgia, o processo de fundição realizado com os minérios que foram separados da rocha gera resíduos chamados de escória, que também podem conter em sua composição esse tipo de metal – neste caso, zinco, chumbo, cobre e arsênio.

Sedimentos analisados mostram esferas que podem provir da escória

A pesquisadora encontrou indícios do resíduo de metalurgia em suas amostras de sedimentos, o que indica que, até hoje, ele está interagindo com o ambiente e sendo transportado. “Identificamos esferas típicas de atividades metalúrgicas na porção magnética dos sedimentos em suspensão, além de sua composição química ser similar à detectada nas escórias”, conta. “Supõe-se que sejam resíduos da metalurgia que vêm sendo transportadas e moídas ao longo do rio, ou seja, desgastadas por atrito até que atinjam um tamanho pequeno suficiente para sua incorporação ao sedimento em suspensão”.

A detecção dos metais pesados chumbo, zinco e cobre nos sedimentos mostra que os dois tipos de resíduos estão interagindo com o sistema aquático em questão. Foram quatro os tipos de sedimentos analisados ao longo do Rio Ribeira de Iguape: aqueles encontrados em bancos de areia, em suspensão na água, no fundo do rio e no sistema estuarino de Iguape-Cananéia, onde ele desemboca. “A concentração de chumbo estava sempre acima do valor de intervenção elaborado pelo Conselho Canadense de Meio Ambiente (CCME), a partir do qual pode vir a gerar riscos aos organismos”, aponta Valéria. A referência canadense é a única existente para comparar teores de metais pesados detectados em sedimentos e serve como indicativo de possível contaminação.

Mesmo com o fim das atividades mineradoras, em 1995, os resíduos da mineração (à esquerda) e da metalurgia (à direita) passaram a ser depositados no solo


Bioindicação

O bivalve foi avaliado como bioindicador da interação entre metais pesados e o ambiente

“Ao contrário do que dizem alguns órgãos ambientais, este rio não está sofrendo processos naturais de depuração”, afirma Valéria, a partir do resultado da análise do molusco Corbicula fluminea: tanto no tecido mole do animal quanto em sua concha, foram encontradas concentrações de chumbo acima dos valores de referência. “Os moluscos são bons bioindicadores, pois podem exibir presença de poluentes caso filtrem água e sedimentos em suspensão contaminados”, explica.

Segundo a pesquisadora, os metais pesados podem continuar sendo absorvidos e transferidos por meio do consumo do molusco, a partir da cadeia alimentar. O desgaste da concha também pode causar a liberação dessas substâncias contaminantes novamente no ambiente. A geóloga continuará os estudos em seu pós-doutoramento, no qual ela pretende realizar o monitoramento dessa espécie bioindicadora para verificar de que forma essa interação vem ocorrendo ao longo do rio.

Mais informações: [email protected], com Valéria Rodrigues Guimarães. Pesquisa orientada pelo professor José Sigolo