Em nova fase, venda de carros perderá força

Depois de sucessivos recordes em vendas e produção, taxas de crescimento de dois dígitos e forte movimento nas concessionárias, a indústria automobilística entra em nova cadência a partir de agora.

Depois de sucessivos recordes em vendas e produção, taxas de crescimento de dois dígitos e forte movimento nas concessionárias, a indústria automobilística entra em nova cadência a partir de agora. Se em 2012 o setor saiu de resultados negativos a uma reação meteórica com os estímulos dados pelo governo, em 2013, a evolução das montadoras começou forte, mas caminha para a acomodação.
 
A curva de crescimento das vendas de carros no país, que em 2012 teve forma parecida com a decolagem de uma aeronave, mostrará neste ano uma trajetória mais ao feitio da aterrissagem de um verdadeiro Boeing, tendo em vista a escala que o mercado alcançou. Ou, como prevê, em tom de brincadeira, Raphael Galante, analista da consultoria Oikonomia, "depois da bonança vem a tempestade".
 
Isso não quer dizer que as vendas terão uma queda brutal em relação ao que se viu até o momento. A própria indústria fala em um novo incremento dos emplacamentos neste mês, após o melhor maio da história. Mas, ficará mais difícil melhorar os resultados do ano passado, já que os efeitos mais intensos dos cortes no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), anunciados em maio de 2012, aconteceram justamente nos três meses seguintes.
 
A base de comparação será, portanto, muito mais forte do que o período de janeiro a maio de 2012 - tão fraco que levou o governo a lançar o pacote de apoio à indústria, fundamental para reverter a tendência negativa que se desenhava até então e permitir um novo recorde nas vendas de veículos.
 
A tendência de desaceleração é um consenso tanto para analistas como para as próprias montadoras. Há, contudo, divergências sobre como será feito esse pouso. A Anfavea, entidade que representa a indústria nacional de veículos, admite que o setor tende a perder ritmo daqui para frente, mas nada que leve a lona o crescimento de 3,5% a 4,5% traçado pela associação até o fim do ano.
 
Por outro lado, analistas independentes falam em estagnação, ou mesmo queda, das vendas até o encerramento de 2013, além de uma desaceleração que poderá ser mais abrupta do que preveem os fabricantes.
 
Galante, da Oikonomia, aposta que, até agosto, o mercado sairá do crescimento para queda acumulada no ano de 0,75%. Para ele, dificilmente será repetido o volume de 1,1 milhão de carros licenciados entre junho e agosto de 2012, quando os consumidores correram às concessionárias para aproveitar descontos no IPI que chegavam a derrubar para zero a alíquota de automóveis populares. Só em agosto de 2012, as vendas de automóveis e utilitários leves ultrapassaram, pela primeira vez na história, a casa de 405 mil unidades.
 
Nas contas da Oikonomia, os emplacamentos ficarão em 965 mil unidades na sequência de três meses até agosto. Para o ano, as previsões da consultoria vão de estagnação das vendas, em volume próximo ao de 2012, até retração de 2% nos emplacamentos. A LCA, outra consultoria que acompanha o mercado automotivo, também projeta forte desaceleração, mas ainda aposta em leve crescimento de 1% nas vendas em 2013.
 
Jogam a favor das previsões mais otimistas da Anfavea o sucesso de carros que alavancaram o mercado de compactos desde o último trimestre do ano passado, a manutenção dos descontos no IPI até dezembro e o aguardado aquecimento da economia, depois de um fraco primeiro trimestre. Fora isso, o crescimento próximo a 9% do mercado, registrado entre janeiro e maio, dá "gordura" para o setor queimar no restante do ano e ainda fechar no azul.
 
Já as projeções mais conservadoras levam em conta os impactos sobre o consumo provocados pela nova escalada da taxa básica de juros - a Selic -, além da seletividade dos bancos na liberação de crédito, em virtude de uma inadimplência que se mantém acima de níveis históricos. São fatores que vão pesar sobre o desempenho do mercado automotivo, salvo nova manobra do governo para cortar impostos dos carros, uma possibilidade que nunca pode ser descartada.
 
"A restrição ao crédito, o aumento dos juros e o efeito da antecipação das vendas de automóveis, que ocorre desde maio de 2012, não gerarão os meios necessários para o país manter os níveis atuais de vendas de veículos. Haverá estagnação se o quadro permanecer como está", afirma Milad Kalume Neto, analista da Jato Dynamic s, que prevê crescimento próximo a 0,5% nas vendas de carros em 2013.
 
Por Eduardo Laguna/ Valor Econômico