Logomarca Indústria 4.0

Indústria 4.0: Estamos preparados?

Por: Fábio M. Fernandes      17/05/2021

Desde 2015, o Brasil e suas indústrias têm realizado diversas discussões, reuniões, conferências e   projetos pilotos com o tema Indústria 4.0. Em 2021, poderíamos presumir que o conceito de I 4.0 já estaria estabelecido na indústria brasileira. Mas não está. 

Então eu coloco algumas questões: 

Há uma expectativa de que em 2025 o Brasil será 4.0. Dentro do cenário atual, você acredita que alcançaremos essa expectativa? 

Por que o Brasil ainda não é 4.0?

Estamos preparados?

Para garantir mais elementos para sua reflexão, vale lembrar que: Não temos as tecnologias e infraestrutura suficientes, nossa realidade é de baixo nível de automação em nossa indústria, falta cultura de inovação, falta de investimentos etc... Enfim, há vários pontos a serem considerados.

É inegável que as ações no sentido de termos um Brasil 4.0 está acontecendo. Mas precisamos escalar essas ações, e aí está o problema. Como escalar a solução?

Sim, estamos fazendo pilotos. Sim, pensamos muito em I4.0. Mas a questão é que não estamos fazendo esses pilotos virarem soluções. Nesta situação, todos os pilotos que conheci “morreram” logo após sua execução pois mostraram que podemos conectar as coisas, mas não demonstraram como escalar soluções. Interessante que em um caso a empresa que executou não o piloto, mas a implantação de I4.0, aparentemente caiu em uma “armadilha”. E que armadilha foi essa?

A empresa instalou sensores, software, big data, monitores com indicadores na planta e descobriu ao longo da implantação que tinha dados, mas não sabia exatamente o que fazer com estes. Isso me lembrou algo que já ouvi em algumas palestras, eles não tinham um banco de dados e sim um “bando de dados”. 


Continua depois da publicidade


Podemos deduzir que parece um problema fácil de resolver, mas não é tão fácil assim. Primeiro, é preciso selecionar os dados corretos a serem utilizados. Depois, temos que definir as tecnologias, estas devem permitir escalar a solução dentro de controles e análises pré-definidas. Fazer um piloto que demonstre a possibilidade da conectividade, insisto, deve estar ligado à ideia de aplicar a solução para toda uma planta produtiva. Escalar a solução é chave para a indústria 4.0.

Neste ponto, retomo a pergunta: Estamos preparados para I4.0?

Para iniciar a resposta gostaria de analisar a curva do Gartner, empresa americana de pesquisa e consultoria (Fig.1).

Essa curva descreve a evolução de tecnologias emergentes, desde o momento que se fazem sentir até se integrarem no nosso dia-a-dia.

No atual estágio de evolução da I4.0, seja no Brasil ou nos demais países do mundo, e olhando para a curva do Gartner, onde estamos?

Figura 1: Curva do Gartner mostra evolução de tecnologias emergentes. (Fonte: Gartner)

Meu entendimento hoje, em 2021, depois de 6 anos trabalhando com o tema Indústria 4.0 e olhando para a curva da Figura 1 é:

Fase 1: Gatilho da Inovação

Passamos pelo gatilho da inovação, onde a principal característica desta fase foi o desenvolvimento de novas tecnologias, novos modelos de negócio, enfim, foco em inovação - e em muitos casos ainda estamos nesta fase. Na curva do Gartner estamos na fase de ascensão da curva.

Nesta etapa experimentamos: Realidade Aumentada, Realidade Virtual, Google Glass, Inteligência Artificial, Robôs Colaborativos, Computação em Nuvem, entre outras tecnologias. Ainda não estávamos muito preocupados em como utilizaríamos estas tecnologias, mas sempre destacávamos o que estas tecnologias poderiam fazer pela humanidade com o advento da era conectada.  Tínhamos na mão uma tecnologia e procurávamos um problema para essa tecnologia solucionar. Porém devemos inverter a ordem das coisas: tenho um problema e qual seria a solução de 4.0 existente ou a ser desenvolvida para resolver esse problema? Ou seja, tenho uma necessidade e devemos buscar a solução tecnológica que atende essa necessidade, e assim iniciar a implantação de uma solução 4.0. 

O interessante é que nesta fase acontece uma explosão de ideias - o que é natural -, afinal estamos diante de uma nova perspectiva para uma revolução industrial e muitos desejam embarcar nessa “vibe”.

Destaco como ponto principal deste período: Oportunidade, Criação e Inovação

Fase 2: Pico de Expectativas

Então chega-se ao pico de expectativas, onde então “podemos tudo” e todas as tecnologias são usadas no máximo fervor e a expectativa supera a realidade. A Indústria 4.0 é o máximo para todos nossos problemas. Mas logo a realidade se instala e caminharemos para a fase 3.

Fase 3: Vale da Desilusão

Percebemos agora que algumas destas tecnologias não se firmaram ou simplesmente não serão aproveitadas como parte da solução de I4.0.  As promessas não estão se concretizando, temos então que desacelerar e repensar as estratégias de I4.0.  

Aqui entendo que está o principal argumento para a resposta da pergunta “estamos preparados para I4.0?”  E a resposta é sim, estamos preparados, já conhecemos as tecnologias, já experimentamos modelos de negócio e agora devemos repensar as estratégias de aplicação do conceito de I4.0.

Nesta curva descendente não se está desistindo da ideia da implantação, mas sim criando maturidade para uma colocação segura de 4.0 principalmente em função do ambiente local onde se está trabalhando o conceito. 

Devemos entender que I4.0 não é um produto, mas sim um conjunto de soluções que permitirão o aproveitamento da conectividade e todos seus benefícios.  

Já nos preparamos para a I4.0. Em muitos países, senão em sua maioria, estamos neste momento na fase de desilusão da curva do Gartner. I4.0, em movimento descendente, mas criando maturidade para sua implantação.

Quer dizer que os early adopters perderam investimentos quando embarcaram nestas ideias? Não creio nessa suposição, mas podemos entender que os early adopters têm a experiência para o entendimento e compartilhamento da solução 4.0 com o resto do mundo. Como mencionei, esses têm a experiência de como escalar a solução e assim fazer com que a I4.0 siga seu caminho pela rampa da iluminação, onde as tecnologias serão realistas em função das aplicações e soluções a serem atingidas e, finalmente, chegarmos à estabilidade no platô de produtividade. 

Agora as tecnologias estão firmes e inseridas no propósito a que se destinam em uma solução 4.0. Efetivamente a roda começará a girar com máxima eficiência e os benefícios serão claros e assimilados pela indústria. Entender que estamos em uma fase descendente pode significar investimento errado, sem retorno ou muito abaixo da expectativa, mas com todas as ferramentas hoje disponíveis estamos criando, errando e aprendendo rápido. Razão fundamental da existência de startups pelo mundo.

Nesta fase, a palavra-chave é Maturidade.

Fase 4: Rampa da Iluminação e Platô de Produtividade

As próximas fases estão chegando rapidamente e neste momento é a discussão que devemos fazer: perceber os problemas buscando as tecnologias já estáveis e com isso escalar a solução para o Value Chain.  Não esqueçamos que a conectividade deve estar associada a toda cadeia produtiva, do fornecedor ao cliente final. Somente com toda cadeia conectada atingiremos o real propósito de oferecer ganhos a toda cadeia. E nesse ponto todos nós já conhecemos I4.0 e seus benefícios.

 

Entendo, então, que o momento que a I4.0 vive no Brasil é de uma ideia que aparentemente não vingou, quase ninguém implanta I4.0 pois ainda não está claro como fazer e nem quais são os seus benefícios. Além do mais, aqueles que o fizeram estão no que classifico como uma “Ilha 4.0”, estão conectados somente na vertical de sua indústria. 

Neste ponto, os benefícios ainda são iniciais e nem sempre repassados ao consumidor porque não foram escalados dentro e fora da empresa. Aparentemente foi apenas um teste. Estamos na descendente da curva, mas com uma grande possibilidade de maturação da ideia para então seguirmos para as fases finais da curva do Gartner.  Sem dúvida a maturação da ideia é necessária, mas todo país que deseja e quer adotar uma solução 4.0 deverá, além de tudo, preparar sua mão de obra, suas academias, suas infraestruturas, suas indústrias para esta possibilidade irreversível que culminará em um melhor aproveitamento de insumos, menores desperdícios, eficiência energética, melhores modelos de negócio e assim por diante.

*O conteúdo e a opinião expressa neste artigo não representam a opinião do Grupo CIMM e são de responsabilidade do autor.

Gostou? Então compartilhe:

Fábio M. Fernandes

Engenheiro de Aplicação com foco na indústria automobilística, atuou por 31 anos no Grupo Bosch, sendo coordenador pelo tema de Indústria 4.0 na Bosch Rexroth desde 2016. Responsável pelas atividades de divulgação e aplicação do tema I4.0 no mercado brasileiro, bem como pelas relações institucionais da Bosch Rexroth com as instituições representativas da indústria brasileira e governamentais. Especialista I4.0, com Especialização em Cidades Inteligentes pela Facens (Sorocaba, SP) e Especialista em Sistemas de Parafusamento Eletrônico.