Conferência na USP debate déficit de engenheiros

Ao contrário do que se propaga o Brasil não precisa de mais faculdades de engenharia. Sobram vagas nos cursos; o que falta são candidatos. Para piorar, a evasão é grande e os alunos que concluem o curso geralmente saem sem uma boa formação.

Por conta desse déficit, o Brasil já está importando profissionais para dar suporte ao seu desenvolvimento. Para reverter esse quadro, não basta atrair mais estudantes para os bancos das faculdades. É preciso atacar o problema na raiz, melhorando a qualidade do ensino médio e superior - de um modo geral -, além de repensar a formação do engenheiro, que precisará ter a inovação como foco.
 
Esse foi, em linhas gerais, o tom dos discursos de abertura da 1ª Conferência USP sobre Engenharia, que começou ontem (25), na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli/USP), no campus da capital. O evento, que termina hoje, reúne especialista do Brasil e do exterior com o objetivo de trazer novas perspectivas para os desafios da engenharia nacional. A solução do déficit de profissionais é um deles.
 
Na opinião do vice-diretor da Poli, José Roberto Castilho Piqueira, a revalorização da profissão nos anos 2000, depois de 15 anos de estagnação, levou a uma correria para se formar mais engenheiros, o que não pode ser resolvido de uma hora para outra. "Precisamos retomar de maneira gradativa, e isso passa pela formação de bons professores", ressaltou. "É preciso aceitar o desafio de começar um debate sério e construtivo sobre a engenharia." Afinal, acrescentou ele, a engenharia é fundamental para a solução de grandes problemas do planeta - água, energia, meio ambiente, saúde pública e, principalmente, a democratização da qualidade de vida.
 
Os números apontados pelo diretor da Poli, José Roberto Cardoso, mostram a extensão do problema.  "As instituições de ensino do País abrem todos os anos cerca de 180 mil vagas, mas somente 150 mil são preenchidas, sendo que apenas  35 mil se formam" contou. "É um rendimento muito baixo e o resultado disso é que já estamos importando profissionais."
 
Como se não bastasse o problema da qualidade do ensino (apenas um entre quatro engenheiros tem uma boa formação), os profissionais são formados para serem especialistas - um conceito herdado da década de 1970, que exigia que o engenheiro saísse da universidade produzindo. "Hoje sabemos que a especialização é inibidora da inovação e que o empreendedorismo não nasce com a pessoa, é uma ciência que se aprende", afirmou Cardoso.
 
O que está em jogo é o futuro do país, salientou o diretor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), João Fernando Gomes de Oliveira. "O desenvolvimento de uma nação depende muito da vontade dos seus jovens", disse. Na Alemanha, exemplificou ele, os jovens estão perdendo o interesse pela engenharia mecânica, justamente em um país que se destacava nessa área. Aqui, nem isso. "Não estamos conseguindo atrair os jovens para as áreas de exatas", disse. "A massa que ingressa nas faculdades não tem condições de atender os requisitos de um curso de engenharia por conta da deficiência de formação no ensino médio", disse.
 
Na pós-graduação e na pesquisa o problema não é menor. Segundo o pró-reitor de Pesquisa da USP, Marco Antonio Zago, a despeito do crescimento no número total de doutores, houve uma redução no número de doutores em engenharia em relação às ciências sociais.
 
Isso sinaliza para um caminho inverso aos dos BRICs, como a China, por exemplo, onde a área de exatas predomina na produção científica. No Brasil, a engenharia figura na 5ª posição e a computação em 9º lugar. Na China, as quatro primeiras áreas são engenharia, física, matemática e computação. "É esse caminho que deveríamos trilhar, buscando uma ciência de ponta forte", finalizou.


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